Energia em Equilíbrio Yoga

6 práticas para se libertar

Escrito por Pedro Kupfer

Quando fazemos uma análise de nós mesmos de uma maneira sincera, conseguiremos observar que, em muitas vezes, buscamos o reconhecimento daqueles que estão ao nosso redor, e acabamos virando escravos desta necessidade que, na verdade, busca preencher a falta de autorreconhecimento ou de aceitação que existe dentro de nós. Essa atitude gera uma série de condutas e situações que são indesejáveis e desnecessárias, das quais podemos não conseguir sair.

Quando nos encontramos nesta situação de prisão, o Yoga nos oferece práticas que podem nos ajudar a encontrar a libertação.

No verso 43 do Sanatsujātīyaṁ, que é um instrutivo diálogo sobre a vida de Yoga inserido no Mahabhārata, considerado por muitos o texto sagrado de maior importância no hinduísmo, o sábio Sanatsujāta ensina ao rei Dhṛtaraṣṭra que existem seis práticas que se relacionam a outros valores da vida.

Existem caminhos que são adequados para os diferentes tipos de pessoas e suas sensibilidades. O conselho que o rei recebe é que o tipo de ensinamento que recebemos precisa visar a história pessoal de cada um, adaptando a forma de expor o conhecimento ao modo de ser de qualquer pessoa.

As seis práticas que o sábio ensina ao rei são as seguintes:

  1. Satyam: coincidir palavras, pensamentos e ações.
  2. Ārjavan: ter uma conduta correta, ser honesto e sincero.
  3. Hrīḥ: é ter simplicidade, modéstia e humildade.
  4. Dama: é buscar equanimidade, tranquilidade e autocontrole.
  5. Śauchan: é ter pureza e limpeza interior.
  6. Vidyā: é conhecer a si mesmo.
1) Satyam: é dizer a verdade. Podendo se relacionar com alinhar palavras, pensamentos e ações.

Quando há alinhamento entre os elementos ficamos mais fortes. Quando não precisamos pensar defensivamente naquilo que dizemos, nos dá a liberdade para fluir naturalmente, afinal, não teremos a necessidade de justificar nossas ações. De tal maneira, isso deixa a vida mais simples e nos leva a uma tranquilidade que nunca nos deixará.

No entanto, é preciso que tenhamos bom-senso ao nos defender das mentiras alheias. Existem muitas maneiras de mentir. Algumas são sutis e outras surgem de repente. Pense no anunciantes do refrigerante, ele não pode dizer que o que vende é água negra com açúcar, porque ninguém compraria o seu produto. Ele precisa então, inventar sobre felicidade, estampado com alguma figura famosa bebendo aquela água preta em frente às câmeras. Uma amiga minha fez uma experiência com uma dessas bebidas: ela ferveu o líquido por algum tempo e viu aquilo se tornar uma espécie de plástico duro, com um cheiro horrível. É claro que um produto como este não é alimento, não tem prāṇa, ou seja, não tem energia vital, portanto, não deveria fazer parte de nossa dieta.

Porém, compramos o refrigerante enganados pela publicidade, pois buscamos aquilo que nos é mostrado, o conforto, o pertencimento a um grupo de pessoas alegres.

Nesse processo de aceitação, esquecemos que o produto vendido é, na verdade, um perigo para a nossa saúde, além de ser um mal para o meio ambiente, já que seu processo de fabricação é altamente lesivo para o ecossistema.

Assim, a primeira prática, satyam, não é dizer apenas a verdade, mas sim praticá-la com equilíbrio e compaixão. Cultivar o satyam é estarmos atentos às nossas escolhas em relação às possíveis mentiras que possam vir a existir depois que nos tornamos capazes de filtrar o que a sociedade nos impõe.

2) Ārjanam é ser simples e reto.

É imprescindível que tenhamos o cuidado de fazermos pensamentos, palavras e ações andarem juntos com o que é correto, com o bem comum e com o dharma.

Dharma é simplesmente não fazer aos demais aquilo que não gostaríamos que fizessem conosco. Desta forma, é preciso ficamos atentos às responsabilidades que temos em relação ao que dizemos e fazemos.

Assim, é necessário que sejamos responsáveis e cuidadosos com nossas palavras e ações, e isso se passa a tudo que fizermos no dia a dia.

Ārjanam é combinar intenções, palavras, ações e aquilo que é certo. Isso é ter retidão: aquilo que eu penso é aquilo que eu falo; aquilo que eu falo é aquilo que eu faço; aquilo que eu faço não fere o bem comum; aquilo que eu faço é o que espero que os outros também fizessem.

Quando se aplicam os dois valores, satyam e ārjavam, uma mudança de vida acontece.

“Devemos buscar a felicidade dos demais, sem julgarmos negativamente o tempo todo, sem reclamar tanto”.

Existe também uma maneira de práticar ārjavam em relação ao nosso próprio corpo. Quando temos alguma dor física, por exemplo, muitas vezes ela se torna uma sofrimento psíquico, pois permitimos que essa dor se espalhe sobre o nosso ego e pensamento. Se estivermos com alguma dor no corpo, não devemos dizer “estou com dor” mas sim “minha cabeça está doendo”, pois quando localizamos a dor acabamos por nos ajudar a lidar melhor com ela.

3) Hrīḥ é simplicidade, conformidade e capacidade de estar em paz, aceitando aquilo que é justo e necessário.

Quando temos essa atitude, nossa vida terá ahiṁsā, ou seja, o mínimo possível de violência para o mundo e os demais. Quando temos conformidade, não quer dizer que estejamos presos ao conformismo, nem mesmo à resignação ou acomodação.

O que fazemos não deve significar sofrimentos e ofensas aos demais. Essa ideia inclui muita compaixão, paciência e sacrifício. Quando praticamos Hrīḥ, damos passagem no trânsito, não queremos sempre chegar em primeiro lugar, deixamos outras pessoas vencerem. Ou seja, vivemos tranquilamente na corrida que a sociedade nos impões. Estamos contentes com menos e a plenitude irá fluir naturalmente em nossa direção.

4) Damaḥ é equanimidade e equilíbrio.

É também a força para dizer não, para não ceder à pressão, seja aquela que vem de dentro de nós ou de fora.

Quando você é incitado à discutir com alguém é melhor ter equilíbrio interior que lhe permita manter-se à margem desta briga que está se formando.

A prática de Damaḥ relacionada às palavras que dizemos significa que devemos evitar dizer algo que diminua os demais às situações do dia a dia, pois quando agimos buscando desqualificação por meio do que dizemos não estamos promovendo a paz, nem a felicidade.

Assim, devemos buscar a felicidade dos demais, sem julgarmos negativamente o tempo todo, sem reclamar tanto. É preciso que usemos palavras doces e harmoniosas, que reconheçamos aquilo que o mundo tem de bom e que todos têm algo de bom. É preciso que deixemos os defeitos de lado e esqueçamos aquilo que possa haver de errado.

Quando um sentimento de raiva surgir, lembre-se de que não há nada de errado em se sentir assim, mas que, tampouco, é certo. A raiva vem a partir de algum desencadeamento e precismos perceber que não ganharemos nada ao descarregar esse sentimento em alguém, mas que também, nada ganharemos ao reprimi-la. Quando sentimos raiva, precisamos sublimá-la, ou seja permitir que ela se torne algo construtivo.

Damah é assumirmos o nosso compromisso de não vitimizarmos os demais, de não descarregarmos nossa raiva e frustrações neles.

5) Śauchan é pureza.

O śauchan divide-se em duas práticas: uma externa e uma interna.

A externa se relaciona ao ambiente e ao próprio corpo.

A interna significa ser capaz de se livrar do remorso e da culpa. Estar limpos é algo que pode ser feito através de uma prece, compreendendo e aceitando as diferentes situações que a vida nos impõe.

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Essa purificação interna existe também quando cultivamos a prática do pratipakṣa bhavana que é relacionar-se com um sentimento que se opõe àquele classificado como indesejável. Ou seja, quando temos mágoa de alguém ou raiva, devemos procurar o lado positivo dessa pessoa e agir com compaixão. Agir assim não é ser hipócrita, mas sim com uma atitude de grandeza. E isso nos trará a limpeza interior.

6) Vidyā é o conhecimento de si mesmo, que é o que Yoga busca, o propósito final de todas suas práticas.

Todas as atitudes, todos os valores e todas as maneiras de praticar Yoga tem como propósito a visão de si mesmo como um ser pleno e seu objetivo principal é reconstruir a imagem distorcida ou então, incompleto que temos de nós mesmo, buscando cultivar a visão fundamental: já somos a plenitude que buscamos. Assim, não precisamos nos tornar nada diferente daquilo que já somos.

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O autoconhecimento nos ensina a aceitação, ou seja, a nos aceitar como somos e a compreender que não há nada fora do lugar em nós nem na criação. Para que tenhamos contentamento e a felicidade fazendo parte do nosso lar, todas as pretensões e falsos conceitos sobre o que somos precisam deixar de existir.

Somente quando estes visitantes indesejáveis forem embora é que o conhecimento e a harmonia irão se manifestar em nossas vidas.

Namaste!

Sobre o autor

Pedro Kupfer

Pedro vive de vegetais, praia e surf. É casado com Ângela Sundari, com quem viaja com frequência para surfar, estudar, ensinar e compartilhar momentos bons com os seres humanos, plantas e animais deste belo planeta. Ensina Yoga há 30 anos. Move-se entre Portugal, Brasil, Índia, Indonésia e Chile, lugares que ama por diferentes motivos, sendo o mais importante de todos, as pessoas que conhece neles.

Oṁ Gaṁ Gaṇapataye namaḥ!

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