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A arte e a ciência da educação integral

Três alunas pequenas estão lendo um livro juntas na sala de aula.
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Escrito por Anna Maria Oliveira

A educação integral é mais do que um conjunto de técnicas ou um cronograma estendido; ela representa uma poderosa fusão entre a ciência e a arte. Mas afinal, o que isso quer dizer na prática? O que estamos realmente promovendo nas escolas? Descubra lendo o artigo completo!

“O ideal da educação não é aprender ao máximo, maximizar os resultados, mas é antes de tudo aprender a aprender, é aprender a se desenvolver e aprender a continuar a se desenvolver depois da escola.” – Jean Piaget.

Piaget afirma que a educação ideal não busca apenas preencher a mente com informações, mas sim cultivar as habilidades de pensamento crítico, curiosidade e autodesenvolvimento, essenciais para uma vida de aprendizado e adaptação contínua ao longo da vida.

Destrinchando alguns pontos da afirmação de Piaget:

  • Foco no processo, não apenas no conteúdo: Piaget desvia a atenção da quantidade de informação absorvida (“aprender ao máximo”, “maximizar os resultados”) para a qualidade do processo de aprendizagem. Ele sugere que o valor real da educação não está em acumular dados ou diplomas, mas em capacitar o ser para o próprio aprendizado.
  • Aprender a aprender: em vez de simplesmente memorizar fatos, o aprendiz precisa desenvolver habilidades metacognitivas, ou seja, a capacidade de refletir sobre como aprende, identificar suas próprias estratégias, reconhecer desafios e buscar o conhecimento de forma pró-ativa. É sobre estimular o ser a descobrir as ferramentas necessárias para adquirir novos conhecimentos e habilidades ao longo da vida.
  • Desenvolvimento contínuo: a educação não deve ser vista como um estágio finito que termina após um ciclo de estudos. Piaget evidencia a importância de “aprender a se desenvolver” e “continuar a se desenvolver depois da escola”. Isso significa que a escola precisa estimular a mentalidade de crescimento, preparando os indivíduos para se adaptarem, evoluírem e buscarem novos conhecimentos e experiências mesmo após o período formal de ensino.
  • Autonomia e adaptação: ao aprender a aprender e a se desenvolver, o ser se torna menos dependente de instruções externas e mais capaz de navegar em um mundo em constante mudança, adaptando-se a novas situações e desafios.

Piaget atualíssimo, em tempos de confusão, verdades e mitos sobre Educação Integral e Escola de Tempo Integral – refletir, discutir e debater sobre o tema é uma urgência.

Seis jovens universitários estão sentados e debatendo um assunto em uma biblioteca.
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A Educação Integral é um conceito que, embora pareça contemporâneo, tem raízes profundas na história da educação e do pensamento humano. Não se trata apenas de estender o tempo de permanência do aprendiz na escola (o que é tempo integral), mas sim de uma concepção de educação que busca o desenvolvimento pleno do indivíduo em todas as suas dimensões: intelectual, física, emocional, social, cultural e ética.

A ideia de uma formação humana completa remonta à Grécia Antiga, com a Paideia. Para filósofos como Platão e Aristóteles, a educação visava à formação do cidadão ideal, combinando o desenvolvimento físico (ginástica), intelectual (filosofia, retórica) e moral. O objetivo era formar indivíduos virtuosos e capazes de atuar na pólis (cidade-estado).

No Iluminismo, séculos mais tarde, pensadores como Jean-Jacques Rousseau e John Locke retomaram a ideia de uma educação mais holística, centrada no desenvolvimento natural da criança e na importância da experiência. Para eles, a educação deveria respeitar as fases do desenvolvimento e preparar o indivíduo para a vida em sociedade de forma autônoma.

Com a Revolução Industrial e as questões sociais delas decorrentes, o conceito de educação integral ganhou novas perspectivas. Movimentos como o socialismo utópico e o anarquismo defenderam a educação como um meio de emancipação e transformação social. Eles propunham escolas onde o trabalho manual e o intelectual fossem integrados, buscando o desenvolvimento de trabalhadores completos, conscientes de seus direitos e capazes de atuar na construção de uma sociedade mais justa.

No início do século XX, o movimento da Escola Nova trouxe grande renovação pedagógica, impulsionando a educação integral. Educadores como John Dewey (EUA), Maria Montessori (Itália), Jean Piaget (Suíça) e Célestin Freinet (França) defendiam a escola ativa, centrada no aluno, na experiência e no desenvolvimento integral de suas potencialidades.

Seis crianças estão sentadas em suas cadeiras em uma sala de aula. Elas prestam atenção no que a professora fala.
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No Brasil, o ideal da educação integral ganhou força com o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), liderado por nomes como Anísio Teixeira. Ele foi um grande defensor da escola pública, gratuita, laica e em tempo integral, com o objetivo de promover a equidade e o desenvolvimento pleno de todas as crianças. Sua visão se materializou em projetos como as Escolas-Parque em Salvador (década de 1950), ofereciam um currículo diversificado com atividades artísticas, esportivas e profissionalizantes, além das disciplinas tradicionais.

Mais tarde, na década de 1980, os Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs) no Rio de Janeiro, idealizados por Darcy Ribeiro e Leonel Brizola, representaram outra importante iniciativa de educação em tempo integral, buscando oferecer uma formação mais completa e acolhedora para crianças e jovens em comunidades carentes.

O debate sobre a educação integral se intensificou, sendo compreendida como um projeto educativo que articula os diversos tempos, espaços, agentes e saberes dentro e fora do ambiente escolar. Programas como o Programa Mais Educação (lançado em 2007 no Brasil) buscaram expandir a jornada escolar e o desenvolvimento de atividades integradoras.

A Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996, consolidam a promoção da educação integral, reconhecendo o pleno desenvolvimento do educando como finalidade da educação.

Apesar dos avanços, a implementação da educação integral ainda enfrenta desafios, como a necessidade de investimentos em infraestrutura, formação de educadores e articulação entre diferentes setores e atores sociais. No entanto, o consenso é que ela representa um caminho fundamental para a construção de uma educação mais equitativa, relevante e transformadora, que prepare os indivíduos para os desafios do século XXI.

O cenário atual, se mostra confuso entre bases legais, teóricas, pedagógicas, culturais, sociais e econômicas impondo, em nome dos resultados e números, a criação de ambientes pouco acolhedores e preparados para a materialização da Educação Integral em sua essência, ao menos essa tem sido minha constatação em um dos bairros da periferia da zona norte de São Paulo.

Um caderno simples de matemática de um aluno está aberto em cima de uma mesa de madeira desgastada. Há um lápis em cima do caderno.
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A educação integral é mais do que um conjunto de técnicas ou um cronograma estendido; ela representa uma poderosa fusão entre a ciência e a arte.

A ciência da educação integral reside em suas abordagens estruturadas. Inclui o embasamento em pesquisas da psicologia do desenvolvimento, neurociência da aprendizagem e diversas teorias pedagógicas. Ela se manifesta em currículos bem planejados, metodologias de avaliação formativa e a implementação de projetos interdisciplinares que conectam o conhecimento de forma lógica e comprovada. É o lado do rigor, da evidência e da organização que busca otimizar o processo de ensino-aprendizagem.

Já a arte da educação integral está nas práticas inovadoras e sensíveis dos educadores e no ambiente de aprendizado. É a criatividade para adaptar métodos, a empatia para compreender as necessidades individuais dos aprendizes, a intuição para cultivar talentos e a habilidade de transformar o espaço educacional em ambiente de inspiração. A arte se revela no estímulo à curiosidade, no desenvolvimento das habilidades socioemocionais e na promoção da cultura colaborativa e acolhedora.

Essa união entre o rigor científico e a sensibilidade artística é o que leva a um aprendizado verdadeiramente significativo e uma formação completa. Quando a ciência oferece a estrutura e o conhecimento sobre como as pessoas aprendem, a arte infunde paixão, propósito e personalização, garantindo que o aprendizado não seja apenas eficaz, mas também engajador e transformador. O resultado são indivíduos mais autônomos, adaptáveis e preparados para a vida.

Os desafios para a implementação da Educação Integral de fato e de direito é uma realidade no Brasil, mas a boa notícia é que existem profissionais da educação, espaços formais e não formais de aprendizagem fazendo a diferença na vida de crianças, adolescentes, jovens e adultos.

Para pais, educadores e gestores incorporar os princípios da educação integral em suas realidades, finalizo com reflexões e pequenas atitudes conscientes.

Para pais:

  • Olhe além das notas: observe o desenvolvimento de seu filho em outras áreas. Ele demonstra curiosidade? É empático com os colegas? Consegue resolver problemas do dia a dia? Pense em como podem enriquecer a vida dele com atividades fora da sala de aula que explorem talentos e paixões.
  • Valorize todas as aprendizagens: entenda que a aula de música, o esporte ou o projeto de ciências são tão importantes quanto a matemática, ou o português para a formação completa. Como você pode apoiar essas diferentes dimensões em casa?
  • Seja um modelo: mostre que o aprendizado é contínuo e vai além da escola. Leia, explore novos hobbies, discuta ideias. Seu exemplo é uma poderosa lição de vida.

Para educadores:

  • Pense no aprendiz completo: vá além do conteúdo programático. Quais habilidades socioemocionais seu aluno precisa desenvolver? Como você pode incentivar a criatividade, a colaboração e o pensamento crítico em suas aulas?
  • Integre saberes: busque conexões entre as disciplinas. Como um tema de história pode se ligar a um projeto de arte ou a uma discussão ética? A aprendizagem se torna mais significativa quando os alunos veem a relevância.
  • Use o ambiente a seu favor: a sala de aula e os espaços da escola podem ser flexíveis e convidativos à exploração e à autonomia. Pense em como pequenas mudanças podem estimular diferentes formas de aprendizado.

Para gestores:

  • Promova o diálogo e a formação: crie espaços para que sua equipe discuta a educação integral e ofereça capacitação em metodologias que a promovam. O engajamento começa pela compreensão e pelo apoio.
  • Busque parcerias: a educação integral floresce quando a escola se conecta com a comunidade. Explore parcerias com centros culturais, empresas locais e famílias para ampliar as oportunidades de aprendizado fora dos muros da escola.
  • Revise o tempo e os espaços: avalie como o tempo escolar é utilizado e se os espaços são propícios para atividades diversas. Pequenos ajustes na rotina podem abrir portas para experiências mais ricas e completas.

A educação integral é um convite para pensarmos a educação de forma mais humana e conectada com a vida.

Que pequeno passo você pode dar hoje para começar a construir essa “obra de arte” e “ciência” que é a educação integral em sua realidade?

Boas reflexões e experiências!

Sobre o autor

Anna Maria Oliveira

Educadora com mais de três décadas de dedicação à arte de ensinar e aprender. Minha jornada me levou a explorar diferentes áreas do conhecimento, desde a Pedagogia e Neuropsicopedagogia Institucional até a Arteterapia, onde encontro novas formas de expressão e cura. Acredito no poder da educação para transformar vidas e, por isso, dedico-me à formação de educadores, desenvolvimento de projetos inovadores em arte educação, aulas de meditação e yoga com crianças, e à facilitação de vivências em aprendizagem socioemocional e ética. Como empreendedora em desenvolvimento humano, escritora, roteirista, podcaster e coordenadora pedagógica, compartilho minhas experiências e reflexões para inspirar e conectar pessoas. Junte-se a mim nesta jornada de aprendizado e transformação!

COMO AJUDAR CRIANÇAS A RELAXAR - Guia de Práticas Lúdicas com crianças de 06 a 10 anos para Educadores e Pais.

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