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Lenda do Boitatá

Uma ilustração do Boitatá.
The ponta cabeça, CC BY-SA 4.0 / Wikimedia Commons
Escrito por Eu Sem Fronteiras

Nosso folclore é um dos mais ricos do mundo, baseado nas crenças dos indígenas que habitavam nosso território desde muito antes da chegada do homem branco de Portugal. E uma das lendas mais famosas é a da cobra de fogo chamada boitatá. Neste artigo, você vai conhecer tudo sobre esse bicho assustador!

Origem do boitatá

O boitatá é uma criatura folclórica brasileira que tem suas origens nas crenças dos indígenas que habitavam o nosso país antes da chegada dos colonizadores portugueses. Um dos primeiros registros do boitatá data de 1560, feito pelo padre José de Anchieta:

“Há também outros (fantasmas) que vivem a maior parte do tempo junto do mar e dos rios, e são chamados baetatá, que quer dizer ‘coisa de fogo’, o que é o mesmo como se se dissesse o que é todo de fogo. Não se vê outra coisa senão um facho cintilante correndo para ali; acomete rapidamente os índios e mata-os”, escreveu ele.

Ao contrário do que relatou o padre, a tradução mais correta para o termo “boitatá” é “cobra de fogo” ou “fogo de cobra”, pois “mboî” significa “cobra” em tupi-guarani, enquanto “tatá” significa “fogo”.

A explicação mais difundida por especialistas é que a lenda do boitatá surgiu da observação dos indígenas de um fenômeno conhecido como fogo-fátuo (também chamado de fogo tolo, fogo corredor ou joão-galafoice em alguns lugares do Brasil).

Chamas azuis.
Nneirda de Getty Images / Canva

O fogo-fátuo é uma luz azulada que pode ser vista na superfície de lagos, pântanos e brejos, normalmente se movimentando. A explicação científica mais aceita é que o fenômeno é um efeito causado pela oxidação de fosfina (PH3), difosfano (P2H4) e metano (CH4) junto à ionização de suas moléculas, formando o plasma.

Como viam esse fenômeno que lembra fogo se movimentando por lagos, pântanos e brejos, os indígenas o associaram a essa gigantesca cobra de fogo que matava seres humanos.

Lenda do boitatá

Segundo a lenda, o boitatá é uma gigantesca cobra de fogo que protege os campos, os pântanos e os brejos contra aqueles que desejam fazer mal ao meio ambiente. Essa enorme serpente vive nas águas e, se necessário, pode se transformar também em uma tora em brasa para incendiar as pessoas que estão fazendo mal ao ecossistema.

Há algumas variações da lenda que apresentam o boitatá não como uma entidade protetora do meio ambiente, mas como um simples animal cruel que mata pessoas que estejam andando desacompanhadas em florestas ou outros biomas.

A maior parte das lendas descreve o boitatá como tendo olhos brilhantes e iluminados como dois faróis, além de couro transparente, que cintila quando é noite e o ajuda também a deslizar sorrateiramente pelos ambientes onde fica.

Em outra variação, mais comum no Sul do Brasil, o boitatá tem sua origem numa espécie de noite sem fim, em que uma sucuri (conhecida no Sul como boiguaçu) se aproveita de sua capacidade de enxergar bem no escuro para atacar animais indefesos, focando sempre os olhos deles. De tanto comer olhos, ela teria ficado toda luminosa e inchada de se alimentar.

Boitatá no Brasil

Por ser uma lenda, uma crença de tribos indígenas, num tempo em que as tradições eram contadas oralmente, sem serem registradas por escrito, há variações na lenda do boitatá de região para região no Brasil. Compreenda algumas delas:

Sudeste: no Rio Grande do Sul, na região Sul, e nos estados da região Sudeste, o boitatá ficou mais conhecido como uma criatura simplesmente cruel, que assassinava sem motivações, pelo simples prazer de matar seres humanos.

Sul: a maior variação é em Santa Catarina, onde, em vez de uma serpente de fogo, o boitatá é, na verdade, um touro enorme com um olho gigantesco na testa.

Estátuas de boitatás no Parque Farroupilha.
Hedestad, CC BY-SA 4.0 / Wikimedia Commons / Canva / Eu Sem Fronteiras

Norte e Nordeste: nessas regiões, o animal também é conhecido como batatão, e as lendas mais comuns contam que ele protegia as regiões de matas e florestas, especialmente contra os homens brancos que queriam explorar os recursos naturais.

Centro-Oeste: nessa região, o boitatá é bastante reconhecido como protetor do bioma do Pantanal, especialmente contra aqueles que desejam fazer mal ao ecossistema da região.

Curiosidades sobre o boitatá

Conforme se instalou no Brasil, o catolicismo dos portugueses se aproveitou de algumas lendas dos indígenas para assustá-los, com o objetivo de convertê-los à religião. O boitatá foi uma das lendas apropriadas pelos padres, que passaram a explicar que o animal se alimentava somente das almas daqueles que não haviam se batizado.

Outra curiosidade é que, em alguns lugares da região Nordeste, o boitatá é chamado de “alma dos compadres e das comadres”, porque a crença é que essa criatura anda se rastejando pelas matas para pagar todos os pecados das almas penadas malignas das quais se alimenta. E o ódio é tanto que ele arde em chamas.

Para espantar o boitatá, segundo as principais lendas, a pessoa que o avista precisa parar imediatamente, fechar os olhos e prender a respiração; caso contrário, pode ficar cega ou louca, caso não seja devorada.

Boitatá nos filmes, séries e livros

O boitatá esteve presente em muitas adaptações da lenda original para a ficção e também como objeto de estudo de pesquisadores que escreveram sobre as lendas dos indígenas brasileiros. Confira alguns materiais que podem servir para explorar um pouco mais essa lenda:

Um homem folheando um livro aberto.
ijeab de Getty Images Pro / Canva

“Antologia do Folclore Brasileiro” (1943) e “Geografia dos Mitos Brasileiros” (1947), de Luís da Câmara Cascudo — Câmara Cascudo é considerado até hoje um dos grandes pesquisadores dos mitos e lendas do nosso folclore, tendo registrado muitos deles nos livros que publicou, como esses dois, em que detalha lendas como boitatá, saci, caipora, cuca, entre outros.

“Sítio do Picapau Amarelo” (1920-1947), de Monteiro Lobato — o boitatá apareceu como personagem tanto na série de livros do escritor brasileiro quanto na adaptação da obra para a televisão, veiculada pela Rede Globo (2001).

“Turma da Mônica: Lendas Brasileiras” — esse ser folclórico já apareceu várias vezes e em diversas formas nas histórias do personagem Papa-Capim, criado pelo desenhista Mauricio de Sousa. Ele já foi retratado como uma criatura perversa, mas também como defensor das matas e aliado da tribo do jovem indígena.

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Enfim, o boitatá é uma das lendas mais populares do folclore do nosso país, sendo conhecido por muitas pessoas — e temido por tantas outras. Como deriva de um fenômeno natural de difícil explicação, há quem ainda creia que a existência desse animal folclórico seja real, de tão popular que é o seu mito.

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