“Quando a gente vem de baixo e chega ao topo, a queda dói, mas não destrói. A gente já conhece o chão. Agora, quem sempre viveu no topo, quando cai, dificilmente volta a subir”, refletia Edward, um ex-ricaço do setor da construção civil em Manaus.
Acontece que Edward havia perdido tudo. Antes dessa constatação amarga, morava em Adrianópolis, dirigia um SUV com ar-condicionado polar, tinha ações na Bolsa, um barco ancorado no Tarumã e passava o Réveillon com os amigos em Paris todos os anos.
Você acredita que a vida é injusta? Edward perdeu tudo numa terça-feira de sol escaldante, às dez e meia da manhã, quando o calor abafado fazia o asfalto do Vieiralves borbulhar como caldo fervente.
Foi passado para trás por um sócio. Assinou um contrato no escritório central da empresa, também localizado no Vieiralves, sem ler as letras miúdas. Quando se deu conta, nem o apartamento de cobertura na Ponta Negra estava mais em seu nome.
Na quarta, os portais de notícias locais estampavam a manchete: “Empresário do ramo imobiliário declara falência”. A foto era antiga: ele, num coquetel de luxo, num buffet mais caro e badalado da cidade, taça de espumante na mão, sorriso congelado no rosto, posando para ninguém.
Na sexta, os amigos de Edward e os contatos do WhatsApp sumiram. Na segunda, a esposa pegou um carro por aplicativo com as crianças e partiu para a casa da mãe, no Conjunto Dom Pedro. Deixou um bilhete: “Se refaz, e quem sabe a gente conversa”.
No sábado de manhã, Edward tentou vender o relógio suíço no camelódromo da Eduardo Ribeiro. O vendedor olhou, mordeu a pulseira de couro e disse: “Bonito, mas aqui não vale nem dez reais”. Riu alto, como quem faz graça para o grupo.
À tarde, foi à casa da sogra, no Alvorada. Pediu um café e um prato de arroz com ovo. Ela lhe deu junto com um sermão sobre “quem vive de aparência acaba mendigo”. Ele escutou em silêncio, encarando um retrato antigo da família na parede, onde todos ainda sorriam juntos.
Naquela noite, dormiu em um banco da praça do Centro de Manaus, que fica de frente para o Teatro Amazonas. Sonhou com notas de cem reais flutuando no Rio Negro e acordou com a camisa grudada ao corpo, encharcada de suor e vergonha.
No domingo, apareceu na Praça da Matriz, com a mesma gravata da foto no jornal, pedindo moedas aos turistas que saíam da igreja após a missa. A pele ardida pelo sol, o sapato ainda brilhando de um passado recente.
Um velho conhecido o reconheceu. Trabalhava agora como ambulante vendendo tacacá. Apertou-lhe a mão com pena e disse-lhe:
— Manaus não é para os fracos.
O homem sorriu, sem mágoa, e respondeu:
— O dinheiro me amava mais do que eu o amava. E, como todo amor em excesso, me matou.
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Depois, ajeitou o paletó puído, limpou o suor da testa com um lenço amarrotado e seguiu pela calçada, entre o Teatro Amazonas e as ruínas da Manaus antiga. Caminhava como quem já morrera para o mundo e renascia para a verdade interior: somos o que somos!
Edward nunca mais foi visto em bancos, nem os financeiros, nem os de praça, porque, enfim, aprendera, da forma mais dura, que o essencial não se acumula, guarda-se no coração: família, amor, honestidade, respeito, tudo aquilo que o dinheiro jamais poderá comprar.