Convivendo

Aos meus queridos sensíveis – O poder de abstrair

Escrito por Bluma Hausswolff

Abstraia as pequenas mesquinharias. Isso pode lhe custar alguns dias de luta mental entre a necessidade de esquecer e o desejo de retribuir qualquer mal que lhe tenham feito, eu sei. Mas, abstraia. É um conselho mais eficiente do que aquele sobre o Filtro Solar.

Abstraia, porque as miudezas negativas são, hoje, o grande mal do século. E com acesso a tantas informações, diferentes tipos de pessoas e posturas, em algum momento, certamente, algo irá afetar algum ponto da sua fragilidade.

Se você possui a necessidade de afeto, por exemplo, inevitavelmente poderá voltar a sua atenção para alguém que foi não exatamente recíproco em uma mensagem qualquer. Se você tem aspectos de empatia, voltará a sua atenção para situações onde sofrerá com as dores alheias.

Se você tem a necessidade de atitudes claras, poderá voltar o seu foco para um comentário hostil ou evasivo de algum parente ou amigo. Não o bastante, se você possui esses e outros traços cravados em sua personalidade, é bastante sensível — o que é uma benção de duas faces, pois a percepção elevada pode oscilar entre o entusiasmo diante da vida e o envenenamento psíquico.

Treinar a sua imunidade contra os pequenos caos, portanto, é mais do que uma questão de sobrevivência social — é uma questão de sanidade mental. E abstrair não quer dizer atulhar no fundo de alguma mala de mágoas cada uma das situações em que nos sentimos lesados ou carregados.

Retrair não é o melhor caminho, pois se trata justamente de criar acúmulos, e todo acúmulo em algum momento deságua, transborda. Então, é claro que dialogar é necessário. Especular também é saudável para a autoproteção. Só não é preciso especularmos sobre tudo.

O poder da abstração, na verdade, reside na postura de separação e até aceitação, seja do outro ou de algumas fatalidades — diretas ou indiretas — ao nosso redor. Abstrair significa compreender e seguir. Significa tomar nota de que muitas atitudes que nos deixam amargos dizem mais a respeito dos próprios complexos do outro do que de nós mesmos.

No fundo, a maioria dos desentendimentos não vêm de questões pessoais, mas particulares.

No fundo, a maioria dos desentendimentos não vêm de questões pessoais, mas particulares. Abstrair, ainda, é a única maneira de ser superior sem precisar do apoio de sentimentos pobres, como a arrogância ou a soberba. E não o suficiente, é por meio da abstração que o tempo encontra espaço para preparar surpresas que são mais válidas quando o seu foco de atenção está em coisas mais produtivas. É assim que acontecem as curas, o arrependimento, o perdão.

Um dos primeiros passos para essa mudança é saber respirar. Tome consciência a respeito da sua respiração e use-a para algo mais do que simplesmente existir. Em momentos de tensão nesse mundo cheio de equívocos, puxe o ar fundo, feche os olhos e solte-o devagar, sem vergonha de parecer clichê.

Mentalize as imagens que lhe causam conforto e quando se sentir estável, tente lembrar que você não precisa morrer com a substância tóxica do outro. Se jogue em atividades. Por que você acha que os profissionais da saúde e da mente estão sempre batendo nessa tecla?

Canalize a energia para algo que lhe dê prazer e libere uma quantidade minimamente razoável de oxitocinas e endorfinas — é essencial, sim. E não menos importante, se atenha às particularidades da sua rotina sem tantas intervenções tecnológicas. Isso vai diminuir a porcentagem de vezes em que você cairá nas armadilhas e desconfortos virtuais, além de direcioná-lo(a) para o seu centro e não para o centro da sua timeline. Do outro.

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O caminho é feito de quedas e voos diários. Não há pílulas, apenas exercícios, força mental e vontade de se reinventar. No fim do dia, no entanto, eu garanto: vai ter valido a pena passar por cima sem pisar — mas saltando sobre. Vai ter sido extremamente gratificante ter encontrado o seu eixo sem a necessidade de desestabilizar o seu ambiente. Vai ter sido reforçador, sobretudo, ser alguém do bem.

Sobre o autor

Bluma Hausswolff

Bluma Hausswolff nasceu na Itália, em Milão. É artista da dança, escritora e através da Psicanálise e do leque terapêutico,
deseja tocar o íntimo e expandir o potencial de (ser) humano.

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