Nunca se falou tanto em crise no Brasil como nesses últimos anos. É crise disso e crise daquilo, mas poucos se arriscam a dizer que a causa de todas essas crises é a ausência da ética.
Segundo Leonardo Boff, caso o dinheiro desviado pela corrupção no país fosse aplicado em saúde, subiria em 89% o número de leitos nos hospitais; na educação, poderiam ser abertas 16 milhões de vagas nas escolas; na construção civil, seriam construídas 1,5 milhão de casas.
A corrupção não é, evidentemente, um privilégio do Brasil e envolve dezenas de outros países, no entanto percebe-se que o país vem perdendo a capacidade de autoconfiança, de harmonia, de paz, de ser feliz. Aquela generosidade genuína do povo brasileiro, valores nobres como hospitalidade, confiança, cordialidade parecem ter ficado no passado.
O brasileiro, atualmente, vem fazendo uma estranha aritmética: só faz alguma ação se for levar alguma vantagem. E o que dizer quando essa vantagem respinga na educação? Qual é o papel do educador frente às questões éticas?
Primeiramente, pode-se dizer que o papel do educador frente às questões éticas é de escuta. Ou seja, o educador precisa escutar e acolher as ansiedades dos educandos e apontar para outro caminho. Um caminho de acolhida, paz, justiça e amor. Quando o educando percebe que o educador está apontando para o caminho do respeito, da acolhida, da convivência pacífica, ele reconhece e assume a importância da cidadania em sua vida.
Em segundo lugar, quando o educador desenvolve a capacidade de ouvir as ansiedades dos educandos, ele se aproxima do coração do educando. É no coração dos jovens que se encontra a chave para a ação ética. Todo jovem é sonhador, bondoso, justo e quando o educador apresenta a solidariedade como algo vindo de dentro do coração, do protagonismo do jovem, o educando concorda que somente as ações éticas mudam o mundo para melhor.
Em terceiro lugar, como a sociedade atual caracteriza-se pela pressa, é preciso que o educador “perca tempo” com o educando. Perder tempo significa dar atenção, olhar nos olhos, conversar, ouvir suas queixas. É disso que o jovem brasileiro precisa. Ele não precisa de alguém que lhe diga o que fazer. O jovem já sabe. Ele só precisa de alguém para lhe apoiar. E quem melhor para fazer isso se não o professor, não é mesmo? O problema é que muitos professores não conseguem desempenhar esse papel.
Em quarto lugar, como na sociedade atual temos a nítida sensação de que as horas estão encurtando, o educador precisa priorizar algumas tarefas. Ou seja, o ser humano precisa pensar mais sobre suas ações. Ele precisa fazer coisas essenciais, por exemplo, brincar com os filhos ou observar o pôr-do-sol, num fim de tarde, com a pessoa amada, com a família. Neste turbilhão de coisas, compromissos, tarefas e afazeres, a mensagem latente é: “tempo é dinheiro” e “não há tempo a perder”. Como educar, então, nesse cenário? Como ser ético se os valores que sobressaem são efêmeros?
Em quinto lugar, como toda educação é reflexo do tempo, da cultura e do contexto em que ela ocorre, os educadores que conseguirem “perder tempo” com os educandos terão acertado na Mega-Sena. Portanto, que os educadores não tenham pressa em terminar uma conversa com os educandos, mesmo que eles tenham um cronograma a ser cumprindo, pois a educação não é uma ciência exata. Talvez ouvindo as angústias e frustrações dos educandos, os professores possam tornar-se exemplo para os jovens, aquele que eles tanto buscam em jogadores e artistas.
Qualquer que seja a apólice para uma relação saudável, duradoura e ética entre os educandos, ela vem com o respeito. Sem o respeito pelo que o outro é e como ele se apresenta, a “ética” tem prazo de validade e se sustenta apenas pelas próximas horas. Enfim, tenho uma suposição de importância ainda maior: mesmo que na sociedade atual, como disse Zygmunt Bauman, “tudo seja efêmero, passageiro e líquido”, o professor que conseguir responder o chamado da ética terá a confiança do educando e os valores educativos durarão para sempre.
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