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Um ensaio sobre o Transtorno da Sobrecarga Sensorial – episódio 3

Imagem de uma mulher ruiva, sentada e com vários papéis sobre a sua mesa. A foto simboliza uma pessoa com Transtorno da Sobrecarga Sensorial.
Magenta / Canva

A autorregulação sensorial nasce do reconhecimento da própria sensibilidade e do respeito aos sinais do corpo. Ao ajustar ambientes, vínculos e ritmos internos, o dissonante transforma o silêncio em fonte de equilíbrio, permitindo que sua percepção seja potência, não exaustão.

Estratégias de Autorregulação Sensorial

Antes de qualquer tentativa de “cura”, o primeiro passo é reconhecer o TSS como um espectro natural entre pessoas dissonantes; o segundo é aprender a regular o fluxo de estímulos sem violentar a própria sensibilidade.

A autorregulação sensorial não busca anestesiar a percepção, mas ajustar a intensidade com que o mundo é recebido e processado.

Trata-se de desenvolver uma “ecologia interna” – um modo consciente de administrar o ruído externo e emocional – para que a experiência sensorial continue sendo fonte de conhecimento, e não de exaustão.

A principal estratégia começa então pela “alfabetização” do próprio corpo: aprender a reconhecer os sinais de saturação antes que se convertam em colapso mental.

Para o dissonante, o esgotamento raramente é repentino; ele se acumula em camadas de tensão auditiva, visual, emocional e cognitiva. O corpo envia avisos – um zumbido mental, um aperto no peito, uma irritação inexplicável, uma necessidade urgente de silêncio ou de isolamento – que funcionam como alarmes fisiológicos. Respeitar esses sinais e não tratá-los como fragilidade é o fundamento da autorregulação.

A segunda estratégia envolve o desenho consciente dos ambientes. A pessoa dissonante prospera em espaços que favorecem previsibilidade, textura natural e luz suave.

A organização dos objetos, o controle do volume sonoro, o uso de aromas neutros e a escolha de cores que não agridam a retina são recursos simples, mas poderosos, para restaurar o equilíbrio neurofisiológico. O ambiente, nesse caso, atua como um co-regulador: ele se torna uma extensão do sistema nervoso, ajudando a calibrar o estado interno.

No campo relacional, a autorregulação passa pela gestão dos vínculos e da exposição emocional. Relações baseadas em empatia e previsibilidade oferecem um campo seguro para que o dissonante se expresse sem se sobrecarregar. Já interações ruidosas – marcadas por críticas, cobrança constante ou falta de escuta – amplificam o desconforto e drenam energia vital.

Aprender a modular a presença social, alternando momentos de abertura e recolhimento, é uma forma de autocuidado tão necessária quanto o repouso físico.

Imagem de uma pessoa usando um casaco de frio na cor vermelha. Ela possui o ranstorno da Sobrecarga Sensorial - TSS e está caminhando em direção ao mar.
Pavel Kuznetsov / Pexels / Canva

Por fim, a autorregulação também é ritmo. O dissonante precisa de pausas reais, não apenas intervalos de tempo, mas espaços de silêncio psíquico: caminhar, respirar, contemplar, ouvir música suave, ter diálogos internos prazerosos, vivenciar pequenos prazeres…

Esses recursos não são uma forma de fuga, mas de processamento: apenas o cérebro reorganizando o excesso de informação e restaurando a harmonia interna. Sem essas pausas, a sensibilidade vira peso; com elas, transforma-se em potência criadora.

A maior sabedoria do dissonante está em compreender que seu equilíbrio não depende de se adaptar ao ruído, mas de cultivar o silêncio necessário para continuar ouvindo com profundidade.

A autorregulação, nesse sentido, se apresenta como um ato de liberdade sensorial – o direito de existir no próprio compasso.

Sobre o autor

Luiz Roberto Bodstein

Formado pela Universidade Federal Fluminense e pós-graduado em docência do ensino superior pela Universidade Cândido Mendes. Ocupou vários cargos executivos em empresas como Trimens Consultores, Boehringer do Brasil e Estaleiro Verolme. Consultor pelo Sebrae Nacional para planejamento estratégico e docente da Fundação Getúlio Vargas e do Instituto Brasileiro da Qualidade Nuclear (IBQN) para Sistemas de Gestão. Especializou-se em qualidade na educação (Penn State University, EUA) e desenvolvimento gerencial (London Human Resources Institute, Inglaterra). Atualmente é diretor da Ad Modum Soluções Corporativas, tendo publicado mais de 20 livros e desenvolvido inúmeros cursos organizacionais em suas diferentes áreas de atuação. Conferencista convidado por várias instituições de ensino superior, teve vários de seus artigos publicados em revistas especializadas e jornais de grande circulação, como “O Globo”, “Diário do Comércio” e “Jornal do Brasil”.

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