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A vida de Ana das Dores

Uma casa colonial grande está em destaque na imagem. Na frente da casa, há um gramado e outras plantas. Ao fundo, há o céu limpo.
Luiz Eduardo Pacheco / Pexels / Canva
Escrito por Nina Veiga

Quem foi Ana das Dores? Entre quitandas fumegantes, vozes que enchem o sobrado e histórias ao cair da noite, sua vida simples ganha contornos únicos. O que havia de especial em sua rotina tão comum? Descubra no artigo completo e mergulhe nesse universo encantador!

A casa cheia de gente, as quitandas sendo tiradas dos potes: peta, pastelim, biscoitos de nata, amendoim e os alegres alfenins, sempre os favoritos das crianças. O vozerio dos convivas, preenchendo o espaço, disputava lugar com o piado dos passarinhos, a algazarra das maritacas e o balido das cabras que pastavam solenes no jardim. O sobrado colonial, erguido pelo bisavô, na época da fundação da cidade, ainda no século dezoito, começava a se iluminar, no fim da tarde, como em dia de festa.

No entanto, não era dia santo, nem feriado, nem aniversário de nenhum dos presentes ou outra data comemorativa de importância. Era um dia de semana qualquer. Uma terça-feira comum, na sede da fazenda dos Vieiras. A vida dela era assim.

Uma mesa de café da tarde em que há dois pedaços de bolo e duas xícaras de café está em destaque na imagem. A mesa está em uma varanda. Ao fundo, há o céu limpo, as montanhas e a luz do pôr do sol.
CUHRIG / Getty Images Signature / Canva

Desde pequena, Ana das Dores tinha se acostumado a estar com a casa cheia de tios, primos, irmãos, vizinhos, parentes distantes. Uns chegavam para o almoço e ficavam até depois do café da tarde. Outros davam uma parada, a caminho da capital. Alguns, ainda, passavam meses a tratar de negócios, da saúde ou apenas de visita. A descansar no clima bom e na paisagem histórica de Corumbá de Goiás. O fato é que a casa de Ana sempre estava cheia. Na mesa comprida da refeição, ao desjejum, sucedia-se o almoço.

Ao café da tarde, o jantar e, no final da noite, o pote de biscoitos de queijo acompanhava o bule de chá, à disposição daqueles que ficavam proseando até mais tarde no alpendre, a olhar a paisagem noturna do cerrado enquanto ouviam as histórias e causos de tempos idos e de agora. Assim, desde sempre, gente e comida faziam o cotidiano de Ana das Dores.

Na lida contínua, os dias se passavam a acender o fogo do forno de barro e amassar os biscoitos. A refinar o açúcar de cana, derretendo a rapadura e coando-a no funil de algodão. A apanhar o marmelo e prepará-lo com o açúcar recém-refinado, nos grandes e brilhantes tachos de cobre. Tarefas rotineiras, que ganhavam sentido em torno da grande mesa, entre risadas e conversas. Fazendo da vida que Ana das Dores vivia, uma prática social plena se sentido.

Sobre o autor

Nina Veiga

A artemanualista e ativista delicada Nina Veiga é doutora em educação, escritora, conferencista. Sua pesquisa habita o território da casa e suas artes, na perspectiva da antroposofia da imanência. É idealizadora e coordenadora do coletivo Ativismo Delicado e das pós-graduações: Artes-Manuais para Educação, Artes-Manuais para Terapias e Artes-Manuais para o Brincar. Desenvolve trabalhos de formação de artífices e escritores. Suas oficinas associam o saber teórico-conceitual às artes-manuais como modo de existir e à escrita como produção de si e do mundo.

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