Nos últimos tempos, têm surgido alguns argumentos que seguem a onda da inteligência artificial (IA), sugerindo a possibilidade de ela ocupar o lugar de um terapeuta.
No entanto, a meu ver, esses argumentos não se sustentam quando levamos a sério o que é, de fato, uma terapia — especialmente aquela que busca, junto ao analisando, o mergulho em seu mundo subjetivo. Usar IA como terapeuta é, no mínimo, um equívoco conceitual.
De forma básica — e sabida por milhões —, embora a IA esteja mudando a formatação do mundo em várias e incontáveis áreas, ela continua sendo uma máquina fria, programada para oferecer respostas a quem lhe pergunta. Por mais que caminhe para gerar conteúdo quase de forma autônoma, ainda assim, ela não sente.
Não possui um mundo interno, não vive alegrias ou dores, e jamais será capaz de acessar, com profundidade, a experiência humana. Como bem disse Cazuza: “Solidão a dois de um lado só… Meu mundo que você não vê.”
Lembro que, quando criança, ao chegar da escola, minha mãe me contou que nosso cachorro havia sido atropelado. Chorei um oceano. Um terapeuta humano, diante disso, não apenas perguntaria como me senti, mas provavelmente sentiria comigo, poderia recordar suas próprias perdas e, mesmo que silenciosamente, empatizaria com minha dor.
Uma máquina, por mais avançada que seja, responderia com frases prontas, sem alma. “Janio, imagino que foi difícil”, talvez dissesse. Mas ficaria nisso: uma frase solta, sem calor humano, sem afeto verdadeiro.
Com todo respeito, jamais consideraria uma conversa com uma IA como terapia. Pode até ser útil para organizar pensamentos ou fornecer reflexões, mas está longe de ser uma escuta terapêutica. Falta-lhe sensibilidade, subjetividade, empatia — e principalmente, o que chamamos na psicanálise de transferência.
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Freud, que dedicou mais de 50 anos ao atendimento clínico, afirmou que somos as palavras que trocamos. E não se referia a palavras vazias, mas sim àquelas carregadas de afeto, história, desejo, vida. A verdadeira terapia acontece no encontro humano — não pode ser substituída por algoritmos, chips ou engenharias digitais.