Autoconhecimento Reflexões do editor

Sacudimento

Mulher negra orando
Mikhail Nilov de Pexels no Canva
Escrito por Madaleine

As religiões de matriz africana possuem vários rituais para descarregar energias densas e purificar a alma, contribuindo para promover paz interior e otimismo. Um deles é o poderoso sacudimento. Descubra como ele ocorre e os sentimentos e as sensações que ele produz, a partir do relato de quem passou por essa experiência transformadora.

Sacudir: a forma correta de escrita é sacudir, de acordo com a língua portuguesa. Sacudir significa agitar(-se) em vários sentidos, forte e sucessivamente; fazer tremer, estremecer(-se); pôr em movimento; abanar ou mover, ora para um, ora para outro lado.

Eu diria que uma forte emoção tomou conta de mim quando passei por essa experiência. Doar-se, permitir-se, deixar-se ser cuidada e amparada: foi assim que me senti.

O som dos atabaques, as palmas, a energia da doação, a pureza das intenções. A quantidade de axés recebidos e doados. Como foi bom sentir-me amada.

Fazia algum tempo que eu não experimentava a sensação de desapego, de sentir-me leve e saciada com tão pouco. Em uma lista com menos de 10 itens, eu pude experimentar os cuidados e toda a magia daquele momento que me marcou tão intensamente.

Mulher deitada.
Arina Krasnikova / Pexels / Canva

Recomendações que antecederam esse momento de cuidado intenso também fizeram parte do preparo para esse esperado dia. Quando eu cheguei, parecia que um grande abraço já me esperava. Eu nem podia imaginar que outras pessoas também iriam compartilhar essa experiência única comigo. Na minha pequena ingenuidade, eu pensava que seria aquele um momento único e individual, como de fato fora, mas fiquei surpresa quando outros consulentes foram chegando com seus itens de descarrego.

Um a um, fomos sendo cuidados com o mesmo amor e passamos pelo mesmo processo de cura. Repetindo as palavras do “pai”, eu escutei, de uma forma tão simples e bonita: “Hoje começa um novo ciclo na sua vida! É hora de deixar para trás mágoas e tristezas. Sacudir é uma bênção. O sacudimento vai trazer boas energias, alívio, confiança. Vai fazer você se sentir mais forte e segura. Quando você perceber e olhar para trás, vai ver como as coisas vão mudar!”

Tanta confiança me fez sentir, no fundo da alma, o verdadeiro amor do próximo. Numa mistura de músicas, elementos naturais e reza, aquela energia foi tomando conta de mim, e eu fui sentindo várias sensações diferentes.

A primeira foi uma forte curiosidade. Pediram-me para fechar os olhos, mas eu podia sentir cada movimento fora e dentro de mim. As plantas que eram passadas em meu corpo e batidas no chão me traziam a sensação de que tudo de ruim estava sendo retirado de mim. Depois veio o calor das velas, que me encheu de acalento e confiança. Por último, e não menos impactante, veio aquele surpreendente banho de pipoca. Os montes de pipoca sendo raspados no meu corpo e jogados em cima da minha cabeça eram como uma limpeza profunda e uma chuva de bênçãos, principalmente na minha alma.

Aqueles “pontos” ao fundo, na reunião de pessoas que se doavam em amor, foi me emocionando profundamente.

O pai Abaloaê foi o que mais me emocionou. Pude enxergar, por meio da minha mediunidade, o seu profundo cuidado. Pude enxergar, mesmo com os olhos fechados, sua figura de amor e firmeza. Uma emoção tão gostosa. Por último, o fechamento com o círculo de pólvora. O medo e a ansiedade de estar ali, à mercê do calor daquele fogaréu, foram uma emoção tão intensa. Ao mesmo tempo que a gente se sente vulnerável, se sente protegido. É como se nada nem ninguém pudesse mais nos atingir. Você está ali, presa, e, ao mesmo tempo, livre e forte, sentindo todo aquele calor correr em volta de você. De repente, tudo se acaba.

Para finalizar, fui levada a um lugar reservado, onde minha roupa física foi “cortada” e um banho de ervas abre-caminhos, cheiroso e quentinho, me foi jogado pelo corpo. Uma massagem na aura; um carinho gostoso: sentir cada poro do meu corpo ser preenchido com aquela água bendita. Era como se a purificação daquele momento estivesse realmente “lavando minha alma”.

Ervas para banho.
Quanthem / Getty Images / Canva

Ao me vestir, fui levada até a frente do congá, onde uma vela de sete dias foi acesa em oferenda, para agradecer e pedir tudo o que desejava meu coração. Uma emoção muito intensa tomou conta de mim. Percebi o quão pequena eu era, assim como grata e feliz. Pedir mesmo só a bênção de viver com paz e saúde.

Depois de alguns minutos, fui levada para uma sala reservada, onde, um tempo depois, meus companheiros de sacudimento foram chegando, um a um, tão assustados e acalentados quanto eu. Ali era como se o relógio tivesse parado, e somente eu e o relógio tivéssemos ficado naquele lugar e naquele tempo. Eu e eu mesma — essa foi a sensação. Pude ouvir as batidas do meu coração e sentir o sono reconfortante, depois de todo aquele processo.

Em alguns instantes, a sala foi se enchendo, e fomos sendo aconselhados em grupo pelo baiano. Vou chamá-lo carinhosamente, assim, de Z. P., para não revelar sua identidade. Um ser sábio e de luz. Ele veio, ficou alguns instantes a nos explicar o que eu já escrevi mais acima e depois despediu-se, num bonito ritual de canto e dança em grupo, em que cada um pôde doar-se um pouquinho e deixar sua contribuição. Em minutos, como em um passe de mágica, um a um foi se despedindo, e a sala foi ficando silenciosa e mais vazia.

Meu momento de ir embora também chegou. Eu me despedi de todos os que ainda ficaram, com um forte abraço de agradecimento e um “axé”, que ecoou dentro de mim como um verdadeiro “sacudimento”.

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Sobre o autor

Madaleine

Minha formação acadêmica é em pedagogia. Atuo na área de educação há quase trinta anos, fiz diversos cursos e especializações, além de pós-graduação em supervisão escolar e letramento. Atuei quase 15 no ensino fundamental, desde sempre na educação infantil e na maioria do tempo na escola pública municipal da Cidade de São Paulo. Sempre em busca de aperfeiçoamento profissional, passo ainda a maior parte do tempo estudando — e não por acaso me apaixonei pelo estudo da espiritualidade. Frequentei um espaço durante muitos anos, onde fui acolhida e atendida. Mais tarde passei a ser estudante, depois trabalhadora. A cada dia conheço novas descobertas, além de me encantar ainda mais pelo tema e me aprofundar na espiritualidade como um todo. Eu me interesso também por temas como literatura, filosofia e ciências, além do amor, que, na minha opinião, nunca sai de moda. Mãe de um casal de adolescentes, sigo aprendendo a lidar com os desafios dessa fase tão linda e cheia de descobertas. Eu me considero uma pessoa amada e feliz. Minha missão é aprender e progredir sempre! Fé é uma palavra que gosto sempre de usar. Acreditar e ter esperança em dias melhores é minha meta.
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