Energia em Equilíbrio Yoga

Reflexões sobre a não-violência

Mão verde representando o Ahimsa.
Valerii / Canva PRO
Escrito por Pedro Kupfer

Ahimsa é o sistema de não-violência que Gandhi tornou mundialmente conhecido quando colocou para fora da Índia o Império Britânico sem se utilizar de arma de fogo e violência.

O que poucos sabem é que esse sistema forma o alicerce do Yoga, ou seja, a prática do Yoga começa, ou deveria começar, pela prática da não-violência, pois ela é a condição primordial para que exista ética no Yoga, tendo então veracidade, honestidade, não-possessividade, etc.

Só depois de ter ética e de cultivá-la e que as outras técnicas como ásana, pranayama e meditação podem produzir qualquer resultado. Ou seja, sem uma prática verdadeira e sólida da não-violência não haverá meios para progredir na prática do Yoga.

Existem duas formas de praticar a não-violência, sendo que ambas estão intrinsecamente ligadas: uma pessoal e outra social. No âmbito pessoal, a não-violência se relaciona com a forma que você lida consigo mesmo e com a sua prática individual de Yoga. No âmbito social, o conceito se relaciona com a maneira em que vivemos no mundo, em sociedade: com nossa família, amigos, vizinhos, colegas de trabalho ou qualquer pessoa que você venha a se relacionar.

Duas mulheres brancas praticando ioga.
Cliff Booth / Pexels

A não-violência ligada à vida social depende diretamente da ligada à vida pessoal, da mesma forma que a unha se liga à carne. Quando os praticantes do Yoga ficam totalmente conscientes da ahimsa, a transformação será profunda na sociedade. Imagine uma sociedade sem exército. Imagine quanta paz teríamos e quantas coisas úteis poderíamos fazer com o dinheiro destinado pelos governos aos exércitos?

Mesmo atravessando imensas dificuldades, a Índia, como um país, pode nos ensinar muito sobre a não-violência, pois é o lugar mais tranquilo do mundo para se viajar, mesmo o seu território sendo três vezes menor que o do Brasil e sua população quase sete vezes maior. Por lá, reina shanti, a paz social.

Já no Brasil, temos o crescimento da violência e por isso a sensação de que o espaço nas cidades acabou. Em todos os lugares a violência está, espaços que antes eram de todos nós.

Para mim, isto esta vinculado com a forma com que o indivíduo percebe a si mesmo na sociedade, ou seja, a educação e os valores que recebemos nos levam a ser violentos.

Mulher de cabelos curtos de costas num campo.
Leon Biss / Unsplash

Quando eu era criança, apanhei muito. Meus pais utilizavam o castigo físico como forma de comunicação, dizendo muitas coisas através da violência, física ou verbal. A violência física é uma das piores maneiras de castigar uma criança. Já entre meus irmãos e eu não era diferente, tenho até hoje as cicatrizes nos punhos das marcas de nossas brigas.

Nos meus irmãos e em mim ficou impregnada na memória do subconsciente que os relacionamentos na família aconteciam através da violência, levando-nos a crer que isso fazia parte de toda e qualquer relação.

Quando a violência é banalizada dessa forma, ela deixa o indivíduo cego, fazendo-o agir de uma forma brutal e torpe.

Depois de muitos anos, quando inicie meu caminho no Yoga, descobri que existia o tal sistema da não-violência, achando até que era um negócio chato e desnecessário. Eu ainda não havia compreendido o que ele significava. Hoje, quase 25 anos depois, percebo o quanto ainda preciso entender sobre a não-violência, para poder apagar de mim esses vásanas, essas impressões subconscientes que estão colocando obstáculos ao meu crescimento.

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Essas impressões criaram uma série de dificuldades em meus relacionamentos, mas hoje percebo que a transformação profunda é algo possível. Busco uma mudança genuína e profunda no meu interior, pois, se não houver, acabarei por passar a crença de que a violência faz parte de todos os relacionamentos para os meus filhos e para as pessoas com as quais me relaciono, mantendo um círculo vicioso e sem fim.

Quem conhece minha mãe hoje, não reconhece na senhora aprazível que ela é a pessoa que era antigamente. Sua maior habilidades era o arremesso de tamanco. Logo que comecei a praticar Yoga ela percebeu as mudanças nos meus hábitos e atitudes, percebendo as transformações que estavam crescendo dentro de mim e passou a igualmente praticar e se transformar.

Minha família passou por um processo de mudança e purificação do qual o Yoga tem um papel essencial. Todos os meus irmão praticam e se beneficiam com o Yoga, mesmo que em maior ou menor graus, nos ajudando a curar e a cicatrizar as feridas, reconstruindo nossos relacionamentos.

Com o exemplo da minha família, podemos dizer que, se desejamos uma sociedade mais justa e cheia de paz, além de uma vida pessoal muito mais plena e alegre, precisaremos de fato viver a prática da não-violência.

Pessoa segurando dente de leão durante o pôr-do-sol.
Aleksandr Ledogorov / Unsplash

Shanti, a paz, é o antídoto para a violência. A paz é a condição fundamental para uma vida feliz. Estamos sempre buscando a felicidade, achando que ela depende apenas de conquistarmos e mantermos as coisas pelas quais lutamos. Estamos sempre em busca do amor, da saúde, do dinheiro, mas nos esquecemos totalmente que, se não tivermos paz não conseguiremos desfrutar as coisas que realizamos e portanto, não haverá felicidade possível nesta vida.

A violência nos amarra a ignorância e nos mantêm afastados da nossa própria natureza que é a plenitude e a felicidade.

Não estou escrevendo estas lindas palavras porque consegui superar e controlar toda a minha raiva, ou porque tenha realizado alguma coisa nesse plano, mas porque eu mesmo estou precisando ouvi-las.

Em conclusão, cito um trecho de Confúcio:

Se a não-violência se estabelecer no indivíduo, haverá paz na família.
Havendo paz na família, haverá harmonia na sociedade.
Havendo harmonia na sociedade, haverá justiça na nação.
Havendo justiça na nação, haverá paz e felicidade na terra.

Convido você a praticar a não-violência ao longo dos dias e, se gostar, poderá praticar durante toda a sua vida!
Om shanti!

Sobre o autor

Pedro Kupfer

Pedro vive de vegetais, praia e surf. É casado com Ângela Sundari, com quem viaja com frequência para surfar, estudar, ensinar e compartilhar momentos bons com os seres humanos, plantas e animais deste belo planeta. Ensina Yoga há 30 anos. Move-se entre Portugal, Brasil, Índia, Indonésia e Chile, lugares que ama por diferentes motivos, sendo o mais importante de todos, as pessoas que conhece neles.

Oṁ Gaṁ Gaṇapataye namaḥ!

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