Comportamento

Sobre minha história e resistência

Mulher negra, jovem, com os cabelos naturais soltos ao vento, em meio de uma floresta.

Olá, seja bem-vindx! Neste espaço quero compartilhar com vocês a minha história, a minha vivência e falar sobre como é ser mulher e negra na sociedade. Sente-se e fique à vontade, porque quero que se sinta bem ao ler este artigo e que possa refletir sobre ele.

Meu nome é Beatriz, sou mulher e negra, filha de uma mineira que foi “entregue” a uma família de brancos, na expectativa de uma vida melhor, mas isso não aconteceu; foi um trabalho escravo mascarado de adoção. Já meu pai, filho de empregados domésticos, nasceu e cresceu em São Paulo; ele também não teve uma vida fácil e ainda constrói seu legado.

Eu nasci em tempos difíceis, em 1987. Meus pais moravam de aluguel e meu pai ganhava bem pouco. Nesta época minha mãe não podia trabalhar porque não tinha com quem deixar minha irmã mais velha e eu.

Mulher com filha

Mesmo com tantas dificuldades, foi possível construirmos nossa casa no terreno da minha avó paterna. Meu pai sempre trabalhou muito e ainda trabalha. Ele gosta, mesmo com todos os percalços.

Ele sempre nos ensinou a sermos dignas de nosso trabalho e a nunca deixar de trabalhar, por pior que fosse o emprego. Ele sempre dizia: “Não temos escolha, temos que trabalhar para pagar as contas”. Basicamente era esse o objetivo. Minha mãe, por sua vez, sempre nos ensinou as questões éticas de mulher e nos ensinou a nos defendermos tanto como mulher quanto como negras. Ela sempre dizia para não confiarmos em homem, por mais que fosse da família; se fosse conhecido, então, nunca ficarmos sozinhas com eles. Com relação à nossa cor, não podíamos passar vergonha. Por isso precisávamos estar sempre bem-vestidas (aliás, até hoje), mas o “estar bem-vestida” significa estar com as roupas limpas e passadas, até mesmo porque, naquela época, não tínhamos condições de comprar roupas de marca.

E o cabelo? Esse era um problema, acreditem. Como um cabelo pode ser um problema na vida de alguém? Na nossa vida era… Naquela época (início dos anos 90), não existiam produtos específicos para cabelo crespo, ou seja, tínhamos que nos virar como dava.

Mulher arrumando cabelo da filha

Inicialmente, minha mãe passou a trançar nossos cabelos, porque era mais prático e não dava “trabalho”.

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Na escola, ninguém acreditava que aquele cabelo podia ser meu e me questionavam: “Como um cabelo” duro” podia estar daquele tamanho?”. Mas antes de trançar os cabelos, minha mãe precisava penteá-los. Nós reclamávamos muito, muito mesmo, porque puxava, então ficávamos com o couro cabelo dolorido por dias. Então ela resolveu alisar nossos cabelos. Tínhamos uns cinco ou seis anos na época.

Ainda assim, não era a melhor alternativa, porque o cabelo ficava muito armado, mas pelo menos não reclamávamos mais na hora de pentear.

Com isso, crescemos ao longo de anos alisando os cabelos, sofrendo com queimaduras no couro cabeludo, com queda de cabelo e, por fim, com corte químico, que, em meu ponto de vista, foi o pior.

Mulher negra

Corte químico é nome que se dá ao corte do cabelo feito com química. Já na fase adulta, com o progresso de produtos para cabelo (se é que pode se dizer assim), na sede de ter um cabelo liso, além da química do alisamento, resolvi fazer progressiva (uso de formol nos cabelos).

Segundo a minha cabeleireira da época, o resultado seria melhor. A cada três meses, eu alisava e fazia progressiva. Até que, na terceira vez, ao enxaguar os meus cabelos, notei o desespero da cabeleireira, porque meus cabelos estavam praticamente caindo da raiz.

De acordo com a experiência dela, isso nunca havia acontecido, mas aconteceu.

Fiquei oito meses com praticamente quatro centímetros de cabelo. Onde eu conseguia prender, eu prendia. As pessoas me questionavam por que eu estava daquele jeito, feia, parecendo uma velha com coque e óculos (palavras de minha avó).

Sobre o autor

Beatriz de Andrade Silva

Psicóloga Clínica, orientada pela psicanálise freudiana, Mestranda em Psicologia Social (PUC-SP), especialista em diversidade nas organizações (PUC-SP), pós-graduada em direitos humanos, responsabilidade social e cidadania global (PUC-RS), pós-graduada em psicologia e desenvolvimento infantil, mentora de carreira (FGV) e pesquisadora das relações étnico-raciais. Atuei por oito anos no mercado financeiro, na área de gestão de pessoas, com foco em talent acquisition, treinamento & desenvolvimento. Na área social, sou voluntária em um coletivo que busca colocar a diversidade e inclusão em pauta e ação.
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