Convivendo Maternidade Consciente

O que a maternidade te devolveu?

Mulher branca e jovem em sala de parto segurando um bebê recém nascido.
Escrito por Juliana Meyer Luzio
Pode parecer estranha essa pergunta, mas ela não está errada, pelo contrário! Falamos muito sobre maternidade e sombra, sobre o peso e a loucura que é ser mãe/pai, eu mesma já publiquei aqui no Eu Sem Fronteiras uns quatro textos específicos sobre maternidade, mas tenho me dado conta de que ser mãe me trouxe de volta coisas que ficaram pelo caminho.

Seja por desilusões, traumas, por ter me tornado adulta, por ter me deparado com algumas asperezas da vida, enfim só percebi que havia perdido porque as reencontrei e me assustei com esse reencontro e por isso te pergunto: você já percebeu que se tornar mãe ou pai te fez reencontrar coisas íntimas, diria até de sua essência, e que foram simplesmente esquecidas? Guardadas numa caixinha, num cantinho bem escondido aí dentro de você?

A primeira coisa que percebi que havia perdido e que é extremamente importante para mim foi a espiritualidade! Não falo de religião, falo de uma fé na vida, de uma certeza de que as coisas darão certo se eu batalhar com vontade por elas. De um saber de que tudo está conectado, que um mistério nos guia e basta estarmos disponíveis para enxergarmos nosso caminho.

Nessa espiritualidade também incluo o ato de contemplar, de enxergar o belo nas coisas mais simples, como uma folha caindo ziguezagueando lentamente pelo ar, de agradecer por tudo que diariamente vivenciamos – sejam momentos bons ou ruins.

Percebi que havia perdido isso tudo quando um dia olhando pro meu filho me perguntei: Nossa, o que eu vou dizer pra ele sobre a vida?

Aí me dei conta de que estava vivendo numa racionalidade, num automatismo, num pragmatismo, e que a vida tinha se transformado num processo em que acordava, batalhava pela minha independência, reclamava de tudo: do trânsito, das doenças, das perdas, do barulho, da poluição, de tudo, e aí dormia. Me deu uma tristeza em pensar que era isso que eu diria sobre a vida, que ele iria crescer, trabalhar, conquistar seus objetivos e seguir nesse ritmo.

mãe cansada

Me pareceu pequeno demais esse meu ponto de vista, míope demais para ser transmitido ao meu filho, eu precisava mostrar a ele que a vida é indizível de tão grandiosa, de tão misteriosa. É instigante e desafiadora a ponto de ser a coisa mais preciosa que temos e foi aí que me vi tendo lembranças de como eu acreditava nessa vida e assim numa piscadela o convidei para deitar comigo na grama e contemplando uma árvore, um céu azul, sentimos a brisa pelo corpo, brisa essa que nos presenteou com a tal folha de árvore ziguezagueando lentamente até nós, mostrando na prática a ele a magnitude de contemplar e receber os presentes que nos chegam. Foi aí que me vi contando pra ele que às vezes coisas ruins acontecerão, mas que mesmo assim há beleza em viver. E foi assim que me percebi seguindo a minha rotina de um outro lugar, sem tanto resmungar e com mais leveza em cada passo.

A segunda coisa que reencontrei foi a experiência de que o tempo é atemporal, de que um minuto pode ser apenas 60 segundos e passar num piscar de olhos, mas também uma eternidade e passar mais lentamente do que imaginamos. Esse reencontro foi na rotina insana de acordar cheia de coisas para fazer, sem tempo de respiro, em que numa manhã depois de muitas outras me ouvi acordando meu filho apressada e dizendo que estávamos atrasados e que ele precisava levantar rapidamente.

Quando me ouvi falando isso, parei e me liguei de que todos os dias eu o acordava dessa maneira, que isso não era legal, que eu o estava ensinando a acordar atrasado, apressado todos os dias. Que ele levaria isso pra vida e de novo fiquei triste, mas comecei a buscar em minha memória quando eu comecei a acordar atrasada, a viver apressada, porque essa não era a imagem que eu tinha de mim, pelo contrário, eu me lembrava de ouvir minha mãe falando que o mundo acabaria e eu demoraria um tempinho pra perceber, porque a pressa não fazia parte do meu ser.

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Enfim, na manhã seguinte eu acordei no mesmo horário, fiz tudo que sempre faço ao levantar, só que ao ir acordá-lo me deitei ao seu lado e o acordei com gentileza, com calma, dizendo que um novo dia havia chegado e que precisávamos levantar para vivê-lo.

Assim, nossas manhãs passaram a ser mais tranquilas e não saímos mais da cama sem um abraço aconchegante de bom-dia e curiosamente sem que eu precisasse acordar mais cedo.

O tempo segue o nosso fluxo, nossa agitação e ansiedade, e eu havia me esquecido de que o meu tempo a mim pertence e que só eu posso dizer o seu ritmo, só eu posso escolher entre acordar e sair correndo ou acordar e dar bom-dia pra vida e para aqueles que eu amo. E que essa escolha dirá se o tempo é apressado ou suficiente!

mãe desenhando com sua filha

A terceira coisa que redescobri sobre mim foi a alegria do fazer manual, a maternidade me despertou a vontade de fazer alguns brinquedos, de fazer a decoração dos aniversários, de fazer algumas peças de roupa pro meu pequeno e aí lembrei de que no fim da minha infância e no período da adolescência eu adorava fazer os cartões e as embalagens dos presentes que daria às minhas amigas, cheguei a fazer alguns presentes. Passava horas no quarto decorando móveis com recortes e colagens, reencontrei uma alegria no cozinhar, pois também me lembrei de que fazia tantas coisas na cozinha, bolos, pizzas, biscoitos, coisas que pela correria da rotina haviam sido abolidas.

Enfim, hoje tenho a Îandé e duas máquinas de costura em minha sala onde realizo com muita entrega e amor o feitio de algumas peças com tiragem limitada e com tecidos trazidos de nossas viagens de férias. A criatividade se fez companheira novamente e entre afazeres artesanais pra escola, pra Îandé e pra nós um olhar terno e delicado pras coisas se recriou. Me sinto muito mais Juliana hoje do que seis anos atrás, quando não tinha filho.

Outros reencontros foram ocorrendo nestes cinco anos de maternidade, mas acho que por hora esses bastam para explicar o porquê da pergunta estranha no início do texto. Se a maternidade é um encontro com nossas sombras, sem dúvida é também com nossa LUZ.

Sabe aquele trecho da música “Índios”, da Legião Urbana, que fala “… e é só você que tem a cura pro meu vício de insistir nessa saudade que eu sinto de tudo que eu ainda não vi”, sinto que antes de ser mãe vivia com esse vício de sentir saudade, só que de algo que eu já tinha visto – eu mesma na doçura, na leveza, na fé e na entrega de seguir a vida em seu fluxo natural.

A maternidade me devolveu um pouquinho de mim, um pouquinho daquela criança com brilho nos olhos e autenticidade. Estes dias disse pro meu marido que não sabia explicar por que, mas que eu estava apaixonada por mim, e agora escrevendo este texto acho que é por me sentir em casa, por me reconhecer em essência e por ter coragem de dizer, sim, pra essa criança e deixá-la ser pra sempre em mim.

E você, quais surpresas belas a maternidade te devolveu? Me conte!

Sobre o autor

Juliana Meyer Luzio

Terapeuta que constrói sua clínica através de um espaço que integra fala, consciência corporal e quietude, tornando possível uma reconexão com o que há de belo, delicado e muito forte em nós - nossa saúde.

Formada em Psicologia, Psicanálise, Terapia de Integração Craniossacral, Transmutation Therapy, entre outros, está sempre em busca de conhecimentos que agreguem, em seu dia-a-dia maneiras, diferentes de olhar a vida.

Atualmente, além de sua clínica, lançou a Îandé, onde tem se dedicado à arte de criar e costurar produtos exclusivos e cheios de carinho.

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