Autoconhecimento

Recompensas imediatas na infância e suas consequências para a vida adulta

Escrito por Eu Sem Fronteiras

Sempre estamos buscando alguma coisa. Queremos ter reconhecimento profissional. Queremos estar de bem com a aparência. Queremos viver um grande amor. Queremos ser respeitados por todos. Cada pessoa é um universo à parte, porém, esses são os anseios comuns a maioria. Alguns conquistam rapidamente. Outros demoram mais um pouco. Muitos conquistam um ou outro. Tantos passam a vida lutando e não alcançam seus objetivos.

Por quais motivos não realizamos nossos desejos? Será por incompetência? O destino não quis? Ou ambicionamos coisas irreais e queremos tudo para ontem? Para quem não realiza seus sonhos tem na injustiça a resposta. As reações diante às frustrações são várias. Alguns analisam suas derrotas e traçam outras estratégias para alcançarem seus sonhos. Adultos imaturos descontam sua raiva nas pessoas. Adotam comportamentos desagradáveis. Dão respostas atravessadas, gritam, não perdem a oportunidade de espalhar seu descontentamento.

Crianças também buscam alguma coisa. Ir ao parque todo dia. Comer doces o dia inteiro. Assistir desenhos até tarde. Ganhar brinquedos novos e melhores. Brincar o maior tempo possível. Mas, tudo isso é impossível. Elas precisam ir à escola. Comer doces excessivamente faz mal aos dentes e causa obesidade. Mas, como explicar isso a elas?

Há alguns anos, um comercial fez muito sucesso porque o menino esperneava no supermercado porque queria chicória. A mensagem não era o escândalo, e sim promover a marca de suplemento alimentar infantil. Entretanto, a cena infelizmente é muito comum. No supermercado, as crianças gritam porque querem que os pais comprem doces. No shopping, gritam e se jogam no chão porque exigem que comprem todos os brinquedos que desejam. Querem suas recompensas.

A famosa birra tem início aos dois anos e vai até os quatro. O comportamento ocorre porque as crianças não entendem que nem sempre poderão ter ou fazer o que desejam. Mudanças na rotina, a morte de um familiar ou animal de estimação também podem estar por trás dessa conduta. Diante da frustração, elas descontam a raiva gritando, se jogando ao chão e esperneando. É um pedido de socorro.

A birra, na verdade é uma queda de braço com os pais. As crianças testam a paciência dos adultos. O placar, na maioria das vezes é positivo para elas. Os pais não aguentam a vergonha, a raiva e cedem às chantagens. Comida e brinquedos são os itens utilizados para acabar com a situação.

Mas, quais as consequências em utilizar presentes para acabar com as chantagens? As piores possíveis. A criança acredita que vale tudo para alcançar seus objetivos. Como vê que os pais usam comida e presentes para acabar com as birras, este artifício é utilizado constantemente. Entupir seu filho de comida porque não aguenta mais o escândalo trará obesidade. Uma criança obesa corre o risco de ter hipertensão, diabetes e sofrerá por não conseguir correr e brincar com os amigos. O livre acesso à alimentação como válvula de escape para frustrações causa outro mal. A compulsão alimentar fará seu filho trilhar um caminho perigoso. Toda vez que ele estiver insatisfeito, vai encontrar refúgio em um prato de comida.

Dar o que a criança quiser para acabar com as birras estimula o materialismo infantil.

Ela vai tomar gosto por acumular coisas. O imediatismo de quem cresce tendo suas vontades realizadas tornam as crianças muito egoístas. O resultado disso são adultos que pensam apenas em seu bem-estar.

De acordo com a pesquisadora holandesa Suzanna J. Opree, o materialismo traz alto grau de insatisfação pessoal na fase adulta. Crianças que têm tudo o que querem correm mais risco de terem depressão. Pesquisa australiana encomendada pelo Queen Elizabeth Medical Centre estudou 402 crianças entre 9 e 12 anos. Dessas, 16 já apresentavam sintomas da doença. Os pesquisadores constataram que 112 poderão desenvolver o problema assim que entrarem na vida adulta.

Comida e presentes para acabar com a malcriação é colocar a criança no centro das atenções. A infantolaria faz a criança determinar a dinâmica da família. Os pais chegam ao ponto de saírem de casa apenas para o básico, levar filho à escola, médico e supermercado – tudo pelo medo da criança abrir o berreiro, se jogar no chão e serem repreendidos verbal e moralmente. Quando os pais “arriscam” ter uma vida “normal”, o restaurante, a comida, a sobremesa, tudo é definido para que o filho não faça um escândalo e os matem de vergonha. A criança ganha um imenso e perigoso poder dentro de casa.

Mas, claro que tudo isso pode ser evitado. Dar comida ou presentes para colocar um final às birras é uma escolha sua. Escolha motivada pela sua fraqueza. Você não quer ser a mola propulsora de comportamentos destrutivos. Quase todas as crianças fazem birras. Agora, isto pode ser resolvido. Não precisa ser psicólogo para contornar a situação. Vamos conferir as dicas? Você vai se surpreender com a simplicidade delas.

Como evitar as birras?

Os pais precisam entender que devem utilizar linguagem adequada. Ou seja, falar que o comportamento é inadequado porque fere as regras da boa conduta não adianta. Este entendimento vem com o tempo. A grande missão é fazer as crianças lidarem com as frustrações.

Às vezes, a criança não faz escândalo porque quer um brinquedo. Você não fica nervoso quando está com fome ou em um lugar barulhento? Com os pequenos é a mesma coisa. Por não saber verbalizar o choro e o grito são as formas de chamar atenção para o desconforto. As dicas a seguir devem ser usadas em todos os momentos:

  • Caso a criança esteja em local perigoso, remova-a imediatamente.
  • Bater? Nunca!
  • Pedir calma gritando não é coerente. Nervosismo vai deixar a criança ainda mais nervosa. Você ficará mais impaciente. Conte até três e respire fundo.
  • Não fale muito. Crianças até os 5 anos mantêm a concentração nas palavras por 30 segundos.
  • Quando seu filho estiver calmo, abrace-o.

As próximas dicas levam em conta a idade. As próximas dicas deverão ser combinadas com as anteriores.

→ 2 anos: Leve a criança para um local tranquilo e brinque com ela.

→ Entre 2 e 4 anos: Quando a criança bater o pé e exigir um brinquedo, explique que ele receberá no aniversário ou na data comemorativa mais próxima. Se o presente for caro, peça que escolha um mais em conta. Mas, se não estiver em condições de comprar, deixe isso bem claro.

Como corrigir?

Punir crianças com 2 anos não surte efeito. Elas não entendem que fizeram algo errado e que estão arcando com as consequências. Acima dessa idade, a pedida é tirar algo que é importante. Ficar sem televisão é o clássico. Outra sugestão é criar um “cantinho da disciplina”. O tempo é um minuto para cada ano de vida. A criança precisa compreender que ficou sem TV e foi para o “cantinho da disciplina” porque fez algo errado.

→ Levar ao psicólogo?

Crianças birrentas são muito ansiosas. Às vezes, a ansiedade é tanta que elas suam frio, têm intestino solto e chegam a desmaiar. Em algumas crianças, o comportamento vai até os 6 anos. Nestes casos, o indicado é procurar ajuda de um psicólogo especialista em crianças. Se a criança for muito nova, diga que vão conversar com uma pessoa muito bacana. Se ela for mais crescidinha, explique que os comportamentos dela não são legais para ela e que seria bom conversar com alguém.

Na primeira consulta é ambientar a criança. Conversar, explicar porquê ela está ali e deixá-la à vontade. Na segunda, o psicólogo coleta dos pais informações sobre o comportamento da criança e a observa. Nas demais sessões, o profissional começa o tratamento. Especialistas aconselham aos pais que conversem com os professores e diretor da escola, caso a birra esteja afetando a vida escolar.

→ Antidepressivos para crianças?

Muitos profissionais relutam em receitá-los para crianças. Como os antidepressivos são produzidos e testados, é primordial analisar os benefícios e os riscos do remédio. Especialistas relatam que alguns medicamentos podem comprometer o desenvolvimento cerebral, entretanto, ainda não há consenso sobre o assunto. Incluindo ou não antidepressivos no tratamento, existem sete passos que não podem faltar para acabar com as birras. Vamos conhecê-los?

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  • Externar sentimentos

Christine Bruder, psicanalista especializada em desenvolvimento infantil relata que a criança precisa colocar seus sentimentos para fora. Fale ao seu filho que ele está chorando e que fazemos isso quando estamos descontentes. A profissional assegura que desde pequenas, as crianças compreendem o que é dito e usa a entonação dos pais nesta tarefa.

  • Conversar

Quando sair com seu filho, diga aonde vão e o que vão fazer. Se for às compras, explique que ele precisa ficar ao seu lado, caso contrário vai se perder.

  • Seja exemplo

Ninguém nasce sabendo o que é certo ou errado. Aprendemos com nossos pais. Crianças aprendem com exemplos e não com palavras, portanto, não adianta falar que é feio se jogar no chão, berrar e se debater se você vive aos gritos e briga com todo mundo.

  • Frustrações são coisas da vida

A criança precisa saber disso. Explique isso sutilmente. Se ela quiser brincar justamente quando você estiver ao telefone, não interrompa o que está fazendo. Ver que nem tudo funciona conforme no tempo e do jeito que ela quer é importantíssimo para seu desenvolvimento emocional. Quem sabe que nem sempre está no controle é mais tolerante. Adultos que não aceitam um não como resposta, provavelmente foram crianças que tiveram seus pedidos realizados imediatamente.

  • Prevenir

Quando a criança está com fome, cansaço ou sono “ativam” as birras. Tente não marcar compromissos no mesmo horário em que ela come ou dorme.

  • Calma

Quando seu filho estiver nervoso, dê uma volta com ele no parque. Se tiverem um animal de estimação, faça carinho e brinque com ele. Abraçar a criança e colocá-la no colo são atividades super calmantes. Mas, atenção! Faça tudo isso somente se ele não estiver pedindo.

Como impor limites às crianças?

As medidas apresentadas acima devem ser uma manutenção. Especialistas em comportamento infantil são unânimes: dar limites é fundamental para gerar adultos psicologicamente saudáveis. A tarefa não é simples, ainda mais levando em consideração que cada idade possui necessidades específicas. Via de regra, as dicas abaixo são úteis na difícil e necessária arte de impor limites. Detalharemos uma a uma para ajudar você.

  • Mostre quem está no comando

Autoridade é uma coisa. Autoritarismo é outra totalmente diferente. Autoridade está relacionada à hierarquia. Autoritarismo é “autoridade sem justificativa, que não leva à autonomia nem à responsabilidade”, nas palavras de Maria Irene Maluf, especialista em Psicopedagogia e em Educação Especial. Os pais exercem autoridade quando falam não com firmeza diante as exigências dos filhos em crises de birra. Se esta criança toma consciência que nem tudo pode ser do jeito dela, a tendência é ser um adulto emocionalmente estável.

  • Avise uma vez só

Quando falamos mil vezes a mesma coisa é porque não acreditamos nela. Assim que identificar o primeiro sinal de birra, seja firme e mostre que não aceita este mau comportamento e não dê comida ou presentes para reforçar sua mensagem.

  • Não ameace

Falar para a criança “se você fizer isso, ficará dois dias sem televisão” é perigoso. Se você deixou seu filho deitar e rolar, como ela vai acreditar que será punida?

Atualmente, saber esperar é artigo de luxo. Todos querem satisfazer suas necessidades instantaneamente. Contudo, variáveis retardam as realizações dos nossos objetivos. Quando queremos viajar e não temos dinheiro, precisamos juntar a quantia necessária. Quando estamos loucos para namorar e não aparece ninguém, é porque a pessoa certa ainda não apareceu e você ainda não está preparado para um relacionamento estável. Não importa a variável, esperar faz parte da vida.

Pensando nisso, avalie quais valores você passa ao seu filho. Sabemos que as birras são irritantes. Sem falar na vergonha que os pais sentem. Contudo, acabar com a situação dando chocolates e brinquedos dão espaço a comportamentos destrutivos. As crianças tornam-se egoístas, aprendem que a forma mais rápida de alcançar seus objetivos levando os outros a loucura. Elas ainda podem ter compulsão alimentar e depressão.

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Os pais que são frouxos com os filhos, na verdade, fazem o que sempre fizeram: agem pelo medo. Esses pais também não sabem lidar com as frustrações. Desejam ser bem vistos por todo mundo. Sempre abriram mão dos seus interesses para agradar os outros. Hoje, não falam não para os filhos, porque desejam o bem deles. Mal sabem os prejuízos emocionais que ambos sofrem e sofrerão.

Pense bem antes de ceder às birras. Tenha pulso firme e não caia na tentação de oferecer comida ou brinquedos para acalmar seu filho. A criança é o reflexo do adulto.


  • Escrito por Sumaia Santana da Equipe Eu Sem Fronteiras.

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