Convivendo

Sobre encontros e desencontros

Escrito por Andrea Ralize

Um dia, andando pelos arredores de um cemitério distante, observando o pôr do sol, vi um homem sentado. Parei para conhecê-lo, e o que seria, talvez, uma chuva rápida para refrescar do calor, tornou-se um riacho manso a retornar uma vez mais, outra vez também…

O homem tinha olhos verdadeiros e a maneira como ele perscrutava o momento fez com que eu não conseguisse mais deixar de vê-lo. O contato tornou-se mais íntimo e o tocar de mãos não era de todo desconhecido. Parecia que era mais um reencontro de uma dileta amizade amarelecida pelo tempo. Os abraços denotavam proteção, e o silêncio, retórica.

Nada foi dito. Nada explicado. Nada cobrado. Nada demonstrado. 

Por vários momentos, por muitos mesmo, eu sentia que esse homem, apesar de não se incomodar com a minha presença, preferia ficar só.

No início, eu me contive. Conseguia frear a vontade de estar apenas próxima para sentir a energia de paz que ele me transmitia. No entanto, com o passar dos dias, eu me via forçando situações em que poderia sentir sua presença. De certa forma, isso me fazia mal, pois nunca fico segura do quanto atrapalho com a minha insistência. Sim. Ele continuava em silêncio. O pouco que sei dele, descobri com furtivos olhares, desprevenidas palavras, fugidios lampejos de entrega. Mas isso não importa mais…

Certa vez, cansada de ver a solidão sendo a preferida e eu repelida, resolvi dar a ele um peixinho para fazer-lhe companhia. Assim, a solidão não mais seria a minha rival. O peixe era azul, pequeno e frágil, mas tinha uma alma cuidadora, assim como a do homem, dono da casa.

Esse peixinho, em uma ocasião, sentiu a minha tristeza e não suportando a energia que emanei, morreu. Ele não foi embora de uma vez não. Resistiu, fingiu estar dormindo, reservou sua última força para enganar o homem e continuar ali em sua tarefa de anjo da guarda. Mas em vão, sucumbiu…

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Os olhos do homem deixaram escapar um lampejo de lágrima. Ele gostava do peixe… E eu gostava do homem… E a chuva que era para ser apenas um refrescar de desejo carnal, tornou-se brisa que embala as folhas, tornou-se luz que reflete a imagem, tornou-se água que refresca do calor… Devagar… Bem devagar…

Sobre o autor

Andrea Ralize

Escorpiana, professora de filosofia, revisora de textos, mãe de três seres de luz, praticante de yoga, estudante de Vedanta e, nas horas vagas, escritora de fragmentos da vida.

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