Existe uma contradição que observo há anos no mercado terapêutico: profissionais que ensinam autocuidado, empatia e conexão competem de forma destrutiva entre si. Copiam métodos. Desqualificam colegas. Tentam se colocar acima a qualquer custo. E depois falam de abundância e colaboração nos posts.
A ironia é evidente. Mas a raiz desse comportamento vai além da simples falta de coerência.
Quando uma terapeuta precisa constantemente provar que é melhor que as outras, quando se sente ameaçada pelo sucesso de colegas, quando usa estratégias manipulativas para se destacar, ela carrega algo muito específico: uma ferida profunda de inadequação.
Essa ferida geralmente vem da infância. A menina que nunca foi vista como suficiente. Que precisava competir pela atenção dos pais. Que aprendeu que amor e reconhecimento são recursos escassos que precisam ser disputados. Que internalizou a mensagem de que só há espaço para uma pessoa brilhar.
Essa criança cresce. Vira adulta. Escolhe uma profissão de cuidado. Mas o padrão permanece intacto. Agora ela compete por clientes, por visibilidade, por reconhecimento no mercado. E usa as mesmas estratégias que usava para sobreviver emocionalmente em casa: minimizar os outros para se sentir maior.
O problema é que esse padrão, que pode ter funcionado na infância como mecanismo de sobrevivência, se torna autodestrutivo na vida adulta profissional.
A terapeuta que compete de forma prejudicial geralmente apresenta alguns comportamentos característicos. Ela copia descaradamente o trabalho de outras colegas e depois nega que copiou. Fala mal de outras profissionais em conversas privadas para parecer superior. Tenta se aproximar de alguém estabelecido no mercado apenas para usar a conexão como degrau. Sabota colaborações quando percebe que a outra pessoa pode brilhar também. Minimiza conquistas alheias enquanto infla as próprias.
Tudo isso vem de um lugar de vazio interno. Ela precisa da validação externa constante porque não consegue se validar internamente. E quanto mais ela busca essa validação através da competição, menos ela encontra o que procura.
Porque a validação que vem de se colocar acima dos outros é temporária e frágil. Ela precisa continuar competindo, continuar provando, continuar se comparando. É um ciclo que não tem fim.
O que essa profissional não percebe é o custo gigantesco desse comportamento. Primeiro, ela se desgasta emocionalmente. Viver em modo de competição constante é exaustivo. Ela nunca pode relaxar, nunca pode celebrar genuinamente o sucesso de outra pessoa, nunca pode construir relações autênticas porque sempre está calculando quem está acima ou abaixo.
Segundo, ela destrói sua própria reputação. O mercado terapêutico, especialmente em nichos específicos, é pequeno. As pessoas conversam. Elas percebem padrões. Quando uma terapeuta demonstra consistentemente comportamento competitivo prejudicial, a informação circula. Não publicamente, mas circula.
Outras profissionais param de querer colaborar com ela. Param de indicá-la. Param de confiar. E ela começa a ficar isolada, mesmo que tenha muitos seguidores nas redes sociais. Porque seguidores não são o mesmo que conexões genuínas profissionais.
Terceiro, ela atrai exatamente o tipo de cliente que reflete esse padrão. Clientes que também competem, que também precisam se sentir superiores, que também estão sempre em modo de escassez. E esses clientes são difíceis de trabalhar porque o padrão deles espelha o dela.
Quarto, ela perde oportunidades reais de crescimento. Porque o crescimento verdadeiro no mercado terapêutico vem de colaboração, de indicações mútuas, de construção de rede de apoio. Quando ela compete em vez de colaborar, fecha portas que nunca mais vão se abrir.
E sim, ela fica queimada. Não instantaneamente, mas progressivamente. As pessoas param de acreditar no que ela fala porque percebem a dissonância entre discurso e ação. Como você pode ensinar autoestima se demonstra constantemente que sua própria autoestima depende de estar acima dos outros? Como você pode falar de relações saudáveis se suas relações profissionais são marcadas por manipulação?
A credibilidade é construída devagar e destruída rapidamente. E o comportamento competitivo prejudicial corrói a credibilidade de forma silenciosa, mas implacável.
O mais triste é que essa profissional geralmente não consegue ver o próprio padrão. Ela racionaliza cada comportamento. Não foi cópia, foi inspiração. Não foi falar mal, foi compartilhar preocupação genuína. Não foi usar a pessoa, foi networking estratégico. Ela sempre tem uma justificativa que a protege de olhar para a própria sombra.
E, enquanto ela não olha, o padrão continua. E o custo aumenta.
A transformação só acontece quando ela finalmente admite o que está fazendo. Quando para de se enganar com justificativas e reconhece: eu compito porque tenho medo de não ser suficiente. Eu minimizo outras porque me sinto pequena. Eu manipulo porque não confio que posso ter sucesso sendo autêntica.
Esse reconhecimento é doloroso. Porque significa olhar para a ferida que ela passou a vida inteira tentando esconder. Significa admitir que a menina que precisava competir pela atenção dos pais ainda está comandando suas decisões profissionais.
Mas é também o único caminho para a liberdade.
Quando ela trabalha essa ferida, quando desenvolve validação interna genuína, quando aprende que o sucesso de outra terapeuta não diminui o seu, algo muda. Ela para de precisar competir. E finalmente pode colaborar.
E é aí que o trabalho dela floresce de verdade. Porque quando você não está mais gastando energia competindo, você tem energia para criar. Quando você não está mais com medo de ser ofuscada, você pode brilhar na sua própria luz. Quando você não está mais isolada por causa do seu comportamento, você pode construir parcerias que multiplicam seu alcance.
O mercado terapêutico tem espaço para todas. Cada profissional tem seu jeito, sua abordagem, seu público. Não existe escassez de clientes que precisam de ajuda. Existe apenas a crença interna de escassez que faz algumas profissionais agirem como se precisassem lutar por migalhas.
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E enquanto essa crença não for trabalhada, o padrão vai continuar. Prejudicando a profissional, prejudicando o mercado, prejudicando até os clientes que poderiam se beneficiar de um ambiente mais colaborativo e menos competitivo.
A pergunta que fica é: quanto tempo você vai passar competindo antes de perceber que o que você procura está dentro, não fora? Quanto tempo vai levar para você entender que ser suficiente não depende de ser melhor que as outras?
Porque, quando você finalmente entende isso, tudo muda. E você pode usar sua energia para o que realmente importa: servir bem quem te procura.