Uma vida em rede. Gosto de pensar sobre viver em rede. Gosto de viver em rede. Vivo para ajudar a manter uma rede. Ela não tem nome nem forma definida. Não? Não, por mim, ficaria assim para sempre. E se, por falta de identidade, ela acabasse? Alguém pode perguntar. Ao que responderia: vivamos com isso! Na rede, só atividade.
A rede vive enquanto ação. Sem papel, sem amarras, sem rosto. Antes, rostidade, uma produção social de rosto. Mas, como assim? Pergunta, já desesperado esse outro que aqui habita. Sem rosto, construir um rosto junto? Se não tem nome, se tem rostidade e não rosto, como se distingue? Como é? Essa rede é uma empresa? É uma associação? É uma cooperativa? Uma organização não governamental? Pergunta. Não e sim, respondo, compondo o enigma.
Hora pode atuar como empresa, hora como associação ou cooperativa, até como ONG. No entanto, o que ela é não é fixo, é fluxo. Fluxo contínuo em ação. Se tem um evento, quem é da rede – e quiser – se une a ela e recebe por essa união.
Se há muito trabalho e um da rede precisa de ajuda, quem puder, contribui e recebe por isso. Alerta: o trabalho da rede não é voluntário, mas é trabalho, não lazer! No entanto, diverte e gera renda. Trabalho assim também quero. Lógico.
Sem rotina, sem doutrinas, só agenciamentos, só tarefas. Metas curtas, melhor: alvos. Tem gente por aí dizendo que nossa rede é capim. Outros, que é Teseu, ainda tem quem a queira capim-teseu. Ai, céus!, que é isso? O perguntador já está se irritando. Capim, porque é feito raízes de capim, se espalham sem começo sem fim, sem hierarquia.
Nossa rede não tem central, só periferia. Teseu, por causa do novelo. Novelo? É, o novelo de Teseu, dado por Ariadne. Na rede, andamos no labirinto, com o minotauro à espreita, feito herói grego. Não tem receita, o fio não puxa, vai ficando para trás à medida que caminhamos. Na volta, depois da experiência, se der, recolhemos o fio e com ele vamos narrando o que fizemos e por onde andamos. Para quê? Ora, para simplesmente inspirar outros a redar.
Um conceito: Deleuze e Guattari propõem abrir o corpo a conexões e territórios, buscar novas formas de expressão, experimentar em lugar de significar e interpretar, abrir-se às multiplicidades que nos atravessam e as intensidades que nos ocorrem, tratar-se e tratar aos demais como fluxos e não como códigos, reinventar coletivamente os regimes de paixão, construir (com prudência e paciência, porém sem medo) fluxo por fluxo.
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Um exemplo: a proposta dessa experiência corporal-social está se constituindo através de uma rede de artistas, artífices, artesãs e arteducadoras. Elas se apoiam em ações de produção, eventos, docência, capacitação e criação.
É um trabalho que envolve produção de conhecimento e geração de renda para mulheres de classe baixa e média. Mulheres que trabalham em casa, imbricadas com os afazeres do cotidiano, as artes, os filhos e a Internet. Nossa rede é tipo capim, dá em toda parte, rizoma constituído de muitos nós.