Convivendo Mulheres Vítimas de Agressão

Lei Maria da Penha – lei bem mais abrangente do que se imagina, mas o judiciário não esta pronto para ajudar as mulheres vítimas de agressão

Mulher olhando para cima enquanto um homem aponta os dedos para ela.
Escrito por Daniela Schwery
Quando se fala em Lei Maria da Penha, o pensamento que vem à cabeça é que se trata de lei de agressão física contra as mulheres. Mas você sabia que não é só isso? A Lei Maria da Penha vai além e versa também sobre o abuso psicológico, moral, sexual e o patrimônio. Mas o Judiciário está pronto para ajudar os casos de agressão contra as mulheres? Continue a leitura e saiba um pouco mais sobre um caso real e a opinião de um especialista da área.

Uma vítima, que não pode se identificar por questão de segurança, relata anonimamente que seu marido criticava muito seu vestuário. Dizia que parecia uma vagabunda e que se não fosse por ele, ela estaria largada sem ninguém e que ela devia agradecer por ter filhos com ele, entre outros diversos insultos e abusos. A vítima é pobre, pais humildes, sem condições financeiras de ajudá-la e, em pleno 2019, ainda se escuta “é seu marido, tem que apoiá-lo, tem que ser compreensiva” ou ainda coisas como “ele só está estressado, deixa de ser fresca”.

Então quando a vítima relatava aos pais o que se passava dentro de casa, não tinha apoio algum, o que fortalecia mais ainda o marido agressor, que, ciente da postura dos pais da vítima, manipulava a situação como bem queria a fazendo passar por “reclamona”, “ingrata”. A traía e levava outras mulheres e casais para a casa do casal, muitas vezes a forçando a aceitar o estilo de vida “casal aberto” – o que negava fazer, mas no entorno mais próximo era sabido. Não contente, perante os outros fazia a mulher parecer uma louca. E, claro, ela devia só se relacionar com as escolhas dele, pois do contrário era traição e mais agressões a ela.

Mulher deitada no chão com as mãos levantas.

O agressor, ao chegar na casa do casal, nos horários que bem entendia, nos dias e quando bem entendia, investigava o celular da esposa e o computador para checar arquivos temporários, pesquisas realizadas nos motores de buscas, e-mails, registros de chamadas, tudo enfim. Para manter o controle sobre a esposa, o agressor não a deixava ter liberdade financeira, restringia o acesso dela ao dinheiro do casal. Se ela arrumasse emprego, ele ia até o trabalho dela e fazia escândalo para ocorrer a demissão. Porém, um emprego que ele “aceitou”, ele retinha o dinheiro e gastava como bem lhe convinha.

Esta mulher conta que foi abusada por amigo do agressor, engravidou, foi forçada a abortar pois escutava “a culpa é sua que engravidou”. Ela apanhava e ficava presa num quarto por dias, até que ele a liberasse. Visita aos pais e demais familiares, parentes ou amigos, só quando ele permitia.

Esta vítima era casada com um homem que, devido a sua formação, nos episódios de agressão física sabia agredi-la sem deixar marcas, tornando impossível comprovar lesões corporais por meio do exame de corpo de delito fornecido pela rede hospitalar pública brasileira. Mas o que mais doía mesmo na vítima era o constante abuso emocional e patrimonial, até R$ 5,00 de crédito de celular ela implorava a ele e tinha que justificar porque queria.

Este caso tem amplo respaldo previsto pela Lei Maria da Penha, mas o Judiciário não está pronto para fornecer a ajuda necessária, devido à morosidade, à falta de medidas cautelares admissíveis de forma rápida e devido aos meios estarem corrompidos. O homem em questão mantinha amizade com policiais militares locais do bairro onde residiam, o que fazia com que qualquer manifestação da vítima não prosperasse ou chegasse aos ouvidos do marido antes do Boletim de Ocorrência (BO) ter andamento.

A crença que impera na sociedade é que a mulher, em sua maioria, inventa essas coisas para prejudicar o homem por vingancinha, “coisas de mulher”. Não que uma minoria de mulheres não seja capaz de fazer isso. Sim, elas existem, mas não são essas mulheres que deviam dar o tom de como se deve ser tratado o assunto na Justiça, pois prejudica as reais vítimas que ainda são muitas.

Essa mulher não conseguiu ajuda via Justiça, mas sim por meio de pessoas que a ajudaram sorrateiramente a sair desta situação, até mesmo porque em meio à lavagem cerebral que ela sofria, com manipulação e chantagem, ela tinha medo de perder seus filhos ou minimamente não conseguir sustentá-los. Não raro, o marido agressor pegava os filhos e sumia com eles, voltava quando queria.

Para Luiz Augusto Vianna, da Grande São Paulo, especialista em Direito Criminal, pós-graduado na Lei Maria da Penha, que atua há mais de 10 anos na área, diz que realmente a Lei nº. 11.340 de 07 de agosto de 2006 (a Lei Maria da Penha) é muito abrangente e dá amplo respaldo jurídico ao fato acima narrado. Porém, somente na teoria, pois na prática a questão da morosidade, burocracia e certas condutas questionáveis tomadas por quem deveria tornar a aplicabilidade da lei mais eficaz acabam por corrompê-la e, assim, colocar a segurança e integridade física da vítima em risco.

Luiz Augusto Spinola Vianna

lasv_vianna@yahoo.com.br

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Dr. Luiz vai além e alerta que é importante destacar que as Delegacias de Defesa da Mulher, embora sejam consideradas “especializadas” para o atendimento desses crimes abrangidos pela Lei Maria da Penha, devido ao grande número de Boletins de Ocorrências registrados, não conseguem dar a celeridade e urgência que o caso requer, fazendo com que assim as vítimas recorram a outros órgãos que prestem auxílio à mulher vítima de violência doméstica e familiar.

Tiramos umas dúvidas com ele que podem ajudar outras mulheres em condição semelhante:

A mulher morando com o marido na mesma casa pode fazer o que nos casos como o da história acima?

No caso específico acima, com a vítima acuada, tolhida financeiramente, vigiada, sem respaldo da família, o melhor é agir de forma sigilosa, procurar pessoas que possam a acolher (de preferência, pessoas que o agressor não tenha conhecimento ou muitas informações), prestando auxílio tanto financeiro como psicológico, uma vez que essa vítima não possui emprego e nem renda.

O primeiro passo é a vítima sair da casa sem os filhos, ir para a casa de um amigo ou amiga, primo ou prima, tios, alguém que seja. Se a vítima levar os filhos pode ainda por cima ser acusada de sequestro, mesmo que deixe um bilhete informando, pois o agressor pode jogar no lixo e também alegar abandono de lar. É uma decisão difícil, mas necessária nesses casos. Por isso tem que ser feita de forma premeditada e sorrateira.

Após tomado esse cuidado, já que há temor de violência contra a própria vítima e seus filhos, deve-se procurar na sua cidade imediatamente e diretamente, de forma sigilosa, o Conselho Tutelar, que age conjuntamente com a Vara da Infância e Juventude. Como o agressor conhece os policiais da sua redondeza e faz o que quer, deve-se procurar também um representante do Ministério Público.

Neste caso, não deve, em hipótese alguma, ir à delegacia local (a do bairro). Deve sair do lar, acionar o Conselho Tutelar que, em casos assim, costuma ser rápido no auxílio, mas cumprirá o protocolo. Deve pedir um local para onde os filhos poderão ser encaminhados. O melhor que a vítima pode fazer é indicar um local de comum acesso, pode indicar os avós, por exemplo, para que ambos (pai/agressor e mãe) possam visitar acompanhados de assistente social, em paralelo ir à Delegacia Especializada da Mulher, mas é importante priorizar o Conselho Tutelar de forma sigilosa, porque esta atitude garantirá que o caso dessa vítima não seja caracterizado como sequestro, ou abandono de lar, nem tampouco que abandonou os filhos e garantirá a segurança dos filhos.

Mulher olhando para baixo chorando.

Se a vítima não tomar esses cuidados, infelizmente até ela mesma pode perder a guarda dos filhos, pois seriam encaminhados para abrigo. Isso se não contente o agressor pegar a brecha e reverter a situação, ficando para ele a guarda. É importante esclarecer que, a princípio, a guarda será compartilhada, a mulher passa por esse incômodo até que o processo seja totalmente instruído e ela consiga comprovar a situação, ficando com a guarda para si.

Por isso é importante, neste caso, além do conselho tutelar, ir à Delegacia da Mulher e já também cuidar da parte civil que é onde pode se pedir pensão alimentícia (além do divórcio, guarda e regulamentação de visitas etc.), o que daria alguma renda para a vítima e filhos, pois não ter renda também pode ser um motivo para perder a guarda dos filhos. Pela minha prática na área, os pais da vítima depois de tomada atitude mais firme, acabam por apoiar, mas deve se dar o primeiro passo.

A mulher não consegue comprovar a agressão física pois não ficava com roxos e nada quebrado. O que pode ser feito neste caso? E como se comprova a agressão psicológica?

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Agressão psicológica pode ser comprovada gravando-se escondido os xingamentos, e/ou por laudos médicos, testemunhos de amigos e/ou vizinhos, comprovar que tem que tomar remédios fortes por conta de abalos sentimentais. Agressão física: gravando escondido os sons dos tapas, pedir para amiga fotografar escondido logo em seguida da agressão, pois exame de corpo de delito pega lesões mais graves, mas fotos em seguida das agressões mostram escoriações, marcas rosadas, arranhões, coisas que o exame de corpo de delito não pega, e testemunhas, se tiver.

Atualmente, a lei prevê que o vizinho(a) pode tomar atitude, seja um amigo ou não, o(a) próprio(a) pode chamar a polícia e/ou denunciar. Neste caso em especial, ficou claro que chamar a polícia seria perda de tempo e um risco à mulher. O vizinho ou vizinha pode realizar denúncia então em outros órgãos que não sejam a delegacia local – a do bairro; pode ele/ela mesmo ir ao Conselho Tutelar ou Vara da Infância e Juventude, e/ou ir à Delegacia da Mulher.

Como fica a questão do patrimônio deste casal?

A Lei Maria da Penha cobre mais a questão criminal, o dano patrimonial. Por exemplo, o marido passa cheque e prejudica o nome da esposa, causa um problema cível na vida da esposa, a vítima fica sem crédito, com o nome negativado; ou vender um carro e não repassar a metade do dinheiro, incorre em apropriação indébita, ou ainda ameaças, constrangimento ilegal. São mais questões assim que a lei cobre. A parte do patrimônio tem que ficar bem resolvido na hora do divórcio – parte civil. Por essa razão que, neste caso da história dessa vítima, é importante resolver a parte criminal que instruirá a parte civil no divórcio.

Como vimos no exemplo acima, a vítima tem sua situação prevista por lei, até mesmo, há meios de denunciar os próprios policiais que fazem “vista grossa” para o agressor desta mulher. Porém, o que faz a lei ser cumprida são as pessoas, pessoas estas que estão na estrutura estatal, o Judiciário.

Aqui se depara com algumas questões:

falta de empatia;
falta de interesse;
falta de agilidade;
falta de respeito ao próximo.

Punhos fechados de um homem com uma moça no fundo olhando para baixo.

O Judiciário tem falhas e brechas, dá prazos em demasia; se não encontrar o agressor para ser citado, 15 dias dali, 15 dias daqui, o delegado pode pedir dilação do prazo, o que pode tomar mais 60 dias sem contar feriados, e a vítima sofrendo agressões de forma continuada, ou no caso acima, ainda tendo que agir de forma sorrateira e contar com favores de terceiros, bem como, viver o terror emocional de perder seus filhos, sem saber se conseguirá emprego depois, sem nenhuma garantia de nada. Para se citar, pode levar um ano e há o que fazer, mas falta interesse em aplicar as leis para que na prática funcionem de forma eficaz.

O funcionário público vê um papel e se esquece que há uma pessoa de carne e osso ali sofrendo um drama, então ele pensa “ah, esse aqui tem mais prazo ainda, vou deixar pra depois”, o oficial de justiça pensa “ah, fui lá e não achei ninguém, fiz meu trabalho” e vai para a padaria pedir o seu pingado, de repente já até bateu a meta do dia, volta para casa ao meio dia para ele sim almoçar com a família dele e só retorna ao fórum no dia seguinte, por aí vai.

Há países que o povo não joga o lixo no chão e aí se pergunta: há lei para isso? Não, não há! Mas há países que precisa haver lei e multa para se cumprir a lei. O que muda? Muda a forma de ver do povo.

O funcionário público, o oficial de justiça, o juiz precisam esperar 15 dias (ou mais) para jogar um andamento processual no sistema para então ser remetido ao Diário Eletrônico e haver publicação? Não, não precisam. Mas fazem assim.

Há horários diferenciados de funcionamento dos fóruns, delegacias e demais órgãos, x horário para advogados, x horário para o público, não fazem plantões eficazes e fecham nos feriados e férias. Agora você acha que uma vítima como a descrita acima pode se adequar a estes horários? De repente, o entendimento que há é que ela deve marcar horário para apanhar e estar disponível para o atendimento das 10h às 12h em dia útil, sem reclamar, pois pode ofender o funcionário público que a atenderá mal se isso fizer e então ele mesmo dará o veredito “por isso que apanha, que mulher desequilibrada”, se ainda não incorrer em desacato à autoridade, um absurdo.

Para se lavrar um Boletim de Ocorrência é uma canseira, uma espera interminável e o atendimento é interrompido caso haja flagrante. Depois ainda terá que voltar à delegacia para fazer a representação, ou, caso seja uma ação incondicionada, ver se não houve arquivamento e havendo, então tomar outras medidas, acionar a ouvidoria, por exemplo.

No caso desta mulher, vamos torcer para apanhar na hora certa e que o marido a tenha liberado para ir à delegacia, esta ainda será encaminhada para fazer o exame de corpo de delito em outro local, mais outro ainda para ir. Vamos torcer também para que ela tenha com quem deixar os filhos hein, ou poder levar junto nesse superpasseio divertido e educativo que é ir à delegacia e fazer exame de corpo de delito. Pior, se não ficar em cima do assunto, não anda, tem que ficar cobrando a delegacia.

Punhos de um homem em frente a uma mulher virada de costas.

O Estado não poderia oferecer a estrutura necessária toda num mesmo local e que fizesse tudo no mesmo dia?

Podia! Salas vazias e pessoas fazendo corpo mole tem aos montes, além que, caso falte recurso humano necessário, o Estado pode e deve contratar mais pessoas. O Estado são pessoas. Também facilitaria muito se informassem o público corretamente, pois muitas vezes os próprios servidores com suas informações erradas fazem que a vítima vá para lá e para cá, perdendo viagem e tempo em locais desnecessários.

Veja o paradoxo: no Código do Consumidor há a facilitação dos direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, ou seja, o consumidor tem a facilidade de fazer com que a outra parte prove as alegativas, não sendo a responsabilidade principal dele. É bacana isto, mas estamos falando ainda assim de produtos ou serviços, não da vida humana e incolumidade física, psíquica e moral.

O caso da mulher acima, com medo, insegura, humilhada, com a alma destroçada, brio amputado, ela tem que se deparar com situações como de gravar escondido, ir a vários lugares (Conselho Tutelar, MP, advogado civil etc.) para se ver livre de um homem que a agride e coloca seus amigos para abusarem sexualmente dela, de forma sorrateira, preocupada se seus filhos estão bem (e não estão, é óbvio que não).

Mulher chorando abaixada reagindo às ameaças de um homem.

Há mulheres que mentem? Há! Mas e as que falam a verdade e que são a maioria aliás? Como ficam?

Quem está lendo aqui pode desconhecer os trâmites legais e nunca ter passado por isso, talvez nunca passe, tomara, mas não devemos esquecer que empatia é a habilidade de se colocar no lugar do outro. Ao compreendermos que Todos Somos Um é porque houve interesse, o interesse colocado em ação e não só por meio de repetições de mantras ou grabovoi gera manifestação de forma ágil.

Basta respeitar ao próximo e o universo não falha, pois se colocarmos na prática o mais básico dos entendimentos “não faça com os outros o que você não quer que façam com você”, estaremos aptos então para a Nova Era, após atravessada a Data Limite, onde consequentemente de forma natural faremos aos outros o que queremos que façam pela gente. Aí o universo flui.

Não podemos deixar que uma geração de egoístas surja com base na prática da espiritualidade, pois o que vemos muito são pessoas se aprofundando na espiritualidade, mas se tornando egoístas e, até mesmo, narcisistas com a crença que no universo tudo pode, se esquecendo que é parte do universo.

Sobre o autor

Daniela Schwery

Daniela Schwery é produtora do livro “Rejuvenesça com Beleza e Espiritualidade”, de Jurandy Leite. Escreveu artigos para Rogério Sanches Buso, do Espaço Antahkarana, e para dra. Renata Franco. É pioneira em mix de tratamentos dermatofuncionais, conteudista da Horta em Casa, bacharel em direito, analista político, analista de gerenciamento de redes sociais, articulista do Meu Brasil Verde e Amarelo, Divergente, Canal do Torto, conteudista do Juca Chaves, e da dra. Jéssica Polese, tendo trabalhado para a campanha política de Aridelmo Teixeira (Fucape) e do dr. Gustavo Peixoto (premiado médico em cirurgia bariátrica) – recordista em arrecadação crowdfunding.

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