Comportamento Convivendo

Hétero-ceticismo, boy sober e a violência contra mulheres: o que está acontecendo e como se proteger

Imagem de uma mulher esgotada e exausta diante da violência de gênero e priorizam segurança, autonomia e paz
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Escrito por Carla Marçal

Mulheres expressam exaustão diante da violência de gênero e priorizam segurança, autonomia e paz. Hétero-ceticismo e boy sober surgem como autocuidado em um cenário que ainda falha em protegê-las. Escolher-se vira um ato de sobrevivência e lucidez.

Cada vez mais mulheres estão dizendo que não querem mais se relacionar com homens. Não porque odeiam homens, mas porque estão cansadas de arriscar a própria vida toda vez que conhecem alguém.

Isso tem nome: hétero-ceticismo. É quando mulheres heterossexuais questionam se vale a pena se relacionar com homens diante dos riscos que isso representa. E tem também o movimento boy sober, mulheres que decidem ficar um período sem se envolver com homens para preservar sua saúde mental, sua segurança, sua paz.

Parece exagero? Vamos aos números.

No Brasil, uma mulher é morta a cada seis horas por violência doméstica. A cada dois segundos, uma mulher é vítima de violência física ou verbal. Em 70% dos casos de feminicídio, o assassino é o parceiro ou ex-parceiro. Você leu certo: a pessoa que deveria amar você é a que tem mais chances de te matar.

Quando uma mulher entra num relacionamento heterossexual, ela está assumindo um risco estatístico. Ela pode encontrar um cara legal ou pode encontrar alguém que vai controlá-la, agredi-la, estuprá-la, matá-la. E o pior: ela não tem como saber qual dos dois é até estar dentro da relação.

Porque homem violento não chega se apresentando como violento. Ele é carinhoso no começo, atencioso, apaixonado. Ele te conquista, te faz acreditar que você encontrou alguém especial. E quando você já está envolvida, emocionalmente e muitas vezes financeiramente dependente, aí ele mostra quem realmente é.

Começa com ciúmes que você acha fofo. Depois vem o controle sobre onde você vai, com quem fala, que roupa usa. Vem a desvalorização, ele te faz sentir que você não vale nada, que ninguém mais te quer, que você tem sorte de estar com ele. Vem o isolamento, ele te afasta da família, das amigas, de qualquer rede de apoio que você tenha.

E quando você já está completamente sozinha, dependente dele, achando que o problema é você, aí vem a violência física. Um empurrão, um tapa, um soco, uma tentativa de estrangulamento. Até que um dia vira feminicídio.

Feminicídio acontece quando o ódio às mulheres mata. É o sentimento de propriedade que alguns homens têm sobre as mulheres. Quando ela tenta sair, quando ela diz não, quando ela ousa ter vontade própria, ele mata. Porque, na cabeça dele, se ela não é dele, não é de mais ninguém.

A misoginia mata. Literalmente. E ela está em todo lugar. Está no homem que acha que mulher precisa servir, está no cara que acha que pode forçar a namorada a fazer sexo, está no pai que ensina o filho que homem não chora, mas não ensina a respeitar mulheres, está na mãe que ensina a filha a se comportar para não ser estuprada em vez de ensinar o filho a não estuprar.

Está na sociedade que pergunta o que a mulher estava fazendo na rua àquela hora, que roupa ela usava, se ela bebeu, se ela provocou. Está na polícia que não registra o boletim de ocorrência, está no juiz que solta o agressor, está no vizinho que ouve os gritos e não faz nada porque “em briga de marido e mulher não se mete a colher”.

E está nas mulheres que estão cansadas. Cansadas de ter medo, cansadas de ter que calcular risco toda vez que conhecem alguém, cansadas de ter que ensinar homem adulto a ter empatia, a fazer terapia, a lidar com as próprias emoções sem agredir ninguém.

Imagem de uma mulher sentada em um sofá de uma sala de estar. Ela está com as mãos sobre o rosto, simbolizando o cansaço de ter medo, o cansaço de ter que calcular risco toda vez que conhecem alguém.
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Por isso o hétero-ceticismo faz sentido. Por isso, mulheres estão escolhendo ficar sozinhas. Porque sozinhas elas dormem em paz, sozinhas elas não precisam ter medo de ser mortas por quem diz que ama, sozinhas elas podem simplesmente existir sem estar constantemente em modo de alerta.

O movimento boy sober propõe exatamente isso: um período sem homens. Sem relacionamento, sem sexo casual, sem dar atenção para homem nenhum. E as mulheres que experimentam relatam a mesma coisa: paz, clareza mental, autoestima recuperada, tempo livre, energia de sobra, dinheiro no bolso, saúde mental restaurada.

Porque relacionamento com homem, em média, custa caro para mulher. Ela assume carga mental, trabalho doméstico, trabalho emocional. Ela vira mãe do parceiro, ela ensina ele a ser adulto, ela gerencia a casa, os filhos, a vida social do casal. Ela abre mão da carreira, ela se adapta, ela cede, ela se anula.

E muitas vezes, além de tudo isso, ela ainda apanha.

Então vamos falar sobre o que fazer se você está numa relação violenta ou conhece alguém que está.

Primeiro: violência doméstica vai além da agressão física. Também existe violência psicológica quando ele te humilha, te xinga, te desvaloriza, te ameaça. Existe violência patrimonial quando ele controla seu dinheiro, te impede de trabalhar, destrói seus bens. Existe violência sexual quando ele te força a fazer sexo, ignora seu não, te estupra. Existe violência moral quando ele te difama, te expõe, mente sobre você.

Se você está passando por qualquer uma dessas violências, saiba: você não provocou, você não merece. Nada justifica violência.

E você pode sair. Existem recursos, canais de ajuda, medidas de proteção. Vamos a eles:

O número 180 é a Central de Atendimento à Mulher. Funciona 24 horas, todos os dias, inclusive finais de semana e feriados. É gratuito e pode ser usado de qualquer telefone fixo ou celular. Lá você recebe orientação sobre o que fazer, sobre seus direitos, sobre como denunciar.

O número 190 é da Polícia Militar. Se você está em perigo imediato, se ele está te agredindo naquele momento, ligue 190. A polícia tem a obrigação de te proteger, de tirar você dali, de prender o agressor em flagrante.

Você pode ir até uma delegacia, de preferência uma Delegacia da Mulher, e registrar boletim de ocorrência. Leve testemunhas, se tiver, leve fotos das lesões, prints de mensagens ameaçadoras, qualquer prova que você tenha. O boletim é importante porque documenta a violência e pode ser usado para pedir medida protetiva.

Medida protetiva é uma ordem judicial que proíbe o agressor de se aproximar de você, da sua casa, do seu trabalho. Ela pode determinar que ele saia de casa se vocês moram juntos, pode proibir contato por qualquer meio. Se ele descumprir, pode ser preso. Para pedir medida protetiva, você registra o boletim de ocorrência e pede na delegacia ou diretamente no fórum.

Existem casas abrigo que acolhem mulheres em situação de violência quando elas não têm para onde ir ou quando o risco de feminicídio é alto. O endereço é sigiloso para proteger as mulheres. Você consegue vaga por meio da delegacia, do CREAS ou do CRAS.

O CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) oferece atendimento psicológico, orientação jurídica e assistência social para mulheres em situação de violência. Procure o CREAS da sua cidade.

Terapia é fundamental. Violência doméstica deixa marcas profundas: trauma, ansiedade, depressão, síndrome do pânico, transtorno de estresse pós-traumático. Você vai precisar de ajuda profissional para processar o que viveu, para reconstruir sua autoestima, para entender os padrões que te levaram até ali e evitar que se repitam.

Conte para pessoas de confiança. Família, amigas, colegas de trabalho. Quanto mais gente souber, mais segura você fica. Violência doméstica prospera no silêncio e no isolamento. Quando você conta, você quebra o ciclo.

Tenha um plano de fuga. Separe documentos seus e dos filhos, se tiver, guarde num lugar seguro fora de casa ou com alguém de confiança. Tenha um celular extra, se possível, deixe uma mala pronta, saiba para onde vai, se precisar sair correndo. Combine uma palavra-código com alguém para pedir ajuda sem que ele perceba.

E se você conhece uma mulher em situação de violência, não a julgue. Não pergunte por que ela não sai, por que ela volta, por que ela aguenta. Sair de uma relação violenta é extremamente difícil. Tem a dependência emocional, a financeira, o medo, a vergonha, a esperança de que ele vai mudar, os filhos, a pressão social.

Imagem de uma mulher que está sofrendo e em uma situação de violência.
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Ofereça ajuda concreta. Diga que a casa dela está aberta, que você pode guardar documentos dela, que você vai com ela à delegacia, que você empresta dinheiro se ela precisar. Acredite nela, não minimize a violência, não fale que é exagero, não diga que todo casal briga. Briga é discussão, violência é crime.

E precisamos falar sobre prevenção. Porque socorrer mulher depois que a violência aconteceu resolve apenas parte do problema, precisamos impedir que aconteça.

Isso passa por educar meninos diferentes. Ensinar desde cedo que bater, xingar, controlar e forçar são inaceitáveis. Que tarefas domésticas são responsabilidade de todo adulto funcional. Que chorar, pedir ajuda e fazer terapia são atitudes saudáveis.

Isso passa por homens se responsabilizarem. Chamar a atenção do amigo que faz piada machista, do colega que assedia, do parente que agride a companheira. Não compactuar, não fingir que não viu, não ser cúmplice.

Isso passa por políticas públicas que funcionem. Delegacias da mulher em todas as cidades, abertas 24 horas. Abrigos suficientes, medidas protetivas cumpridas, agressores punidos de verdade, orçamento para programas de combate à violência contra a mulher.

E passa por cada mulher entender que sua vida vale mais que qualquer relacionamento. Que você merece ser tratada com respeito. Que parceiro que te agride te odeia. Que você pode recomeçar quantas vezes precisar. Que você tem direito de escolher sua segurança.

O hétero-ceticismo e o boy sober são sintomas. São o termômetro mostrando que algo está muito errado. São mulheres dizendo que estão cansadas de morrer, que preferem solidão à violência, que não vão mais aceitar migalhas disfarçadas de relacionamento.

E enquanto a sociedade não muda estruturalmente, enquanto homens não fazem o trabalho deles de desaprender a misoginia, de fazer terapia, de se educar, mulheres vão continuar escolhendo a própria segurança. Vão continuar dizendo não, vão continuar priorizando paz em vez de companhia.

Porque, no fim, a pergunta que fica é: por que arriscar a vida por um relacionamento? Por que aceitar ser diminuída, controlada, agredida? Por que normalizar a violência? Por que ficar?

A resposta está cada vez mais clara para muitas mulheres: não vale a pena. E elas estão saindo, estão denunciando, estão se protegendo, estão escolhendo viver.

Se você precisa de ajuda, ligue 180. Se você está em perigo, ligue 190. Sua vida importa mais que qualquer outra coisa.

Sobre o autor

Carla Marçal

De uma carreira de destaque em grandes corporações à busca incansável por um propósito mais profundo, minha jornada de vida tem sido uma busca constante por significado e realização. Como psicóloga integrativa de formação, alcancei o sucesso profissional em níveis diretivos, acumulando todas as conquistas tradicionalmente associadas à felicidade.

No entanto, sempre senti que faltava algo, uma lacuna na minha busca pela plenitude. Paralelamente à minha carreira, mergulhei nos estudos do comportamento humano, obtendo formação como psicodramatista e aprofundando meu conhecimento em coaching, PNL, antroposofia e outras técnicas. Meu objetivo era claro: auxiliar indivíduos e organizações a prosperarem em processos de mudança, humanização e desenvolvimento pessoal e profissional. Mas ainda assim, algo essencial parecia escapar.

Em 2017, um diagnóstico de câncer de tireoide transformou minha vida de maneira profunda. Optei por um período sabático que se revelou um mergulho profundo em busca do meu verdadeiro propósito. Devorei livros, concluí cursos com diversos mentores e explorei todas as ferramentas disponíveis para desvendar meu destino. Foi nessa jornada de autoconhecimento que encontrei o ThetaHealing®, e minha vida deu um giro transcendental.

De cliente, me tornei terapeuta e instrutora oficial dessa incrível técnica. Além disso, obtive a certificação como operadora de mesa quântica estelar e mesa quântica estelar-pets, além de me tornar professora de MQE. Hoje, sou movida por uma paixão ardente pelo que faço, e vivo plenamente de acordo com meu verdadeiro propósito: espalhar luz, boas vibrações, alegria e energias positivas para ajudar pessoas e o planeta a desfrutar de uma vida plena e feliz.

Minha maior realização é auxiliar pessoas e animais a alcançarem a saúde mental, emocional e física que merecem. A transformação de vidas é a essência do meu trabalho, e estou dedicada a disseminar cura, amor e crescimento, proporcionando uma jornada de descoberta e renovação para todos aqueles que cruzam o meu caminho. Acredito que todos podem alcançar um estado de harmonia, e é isso que me impulsiona a continuar, cada dia, nessa incrível jornada de cura e evolução.

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