Autoconhecimento Meditação

Um estudo sobre a meditação e o ambiente corporativo

Três pessoas meditando em escritório.
Foto: 123rf.
Escrito por Giselli Duarte

“A meditação como complemento no bem-estar dos colaboradores de escritórios corporativos.”

A meditação tem sido uma das terapias alternativas mais buscadas, tanto no âmbito pessoal quanto no profissional, devido aos seus inúmeros benefícios. Nas duas últimas décadas do século 21, uma movimentação crescente vem trazendo à luz questionamentos sobre trabalhadores do mundo corporativo e as doenças que estão cada vez mais tomando conta desse ecossistema. Assim como o estresse, a síndrome de burnout tem sido cada vez mais diagnosticada pelos médicos, tanto em executivos de alto escalão quanto em colaboradores de níveis operacionais, nos mais variados setores de atuação do mercado de trabalho, mostrando que os fatores ambientais podem favorecer o surgimento do estresse dos colaboradores em geral.

Tratei desta temática em meu TCC no MBA, porém senti que deveria compartilhar o assunto com mais pessoas. Na verdade, todos que se interessem pelo assunto, para continuarmos debatendo sobre novas formas de conscientização e mudanças no âmbito corporativo. Tentarei resumir ao máximo e compartilhar os pontos principais.

BEM-ESTAR

Mulher se espreguiçando no trabalho.
Foto: 123rf.

O bem-estar dos trabalhadores é um assunto que, embora muitas organizações já tenham inserido no contexto corporativo, ainda é visto como um grande desafio no que tange às mudanças nas políticas das empresas. A maioria das empresas ainda não tomou a consciência de que o bem-estar de seus trabalhadores interfere diretamente na produtividade de suas respectivas atividades em face ao trabalho desenvolvido em seu ambiente corporativo.

“Frente à cobrança contínua pela resolução de problemas e obtenção de produtividade, empregados ou trabalhadores que desenvolvem atividades diversificadas, em diferentes setores da economia, estão tendo dificuldades para perceber, refletir e agir em beneficio da própria saúde e do bem-estar coletivo.” – Zanelli

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O ESTRESSE DO MUNDO MODERNO

Mulher com a cabeça apoiada em sua mão.
Foto: 123rf.

O estresse do mundo moderno passa a ter um segundo significado. O que antes era visto apenas como uma fisiologia de defesa do nosso organismo agora também é debatido nas esferas as quais interferem diretamente na qualidade de vida do indivíduo.

A alta carga de horas trabalhadas somada ao excesso de trabalho delegado aos trabalhadores, a baixa remuneração e até mesmo o rebaixamento do cargo atual são alguns dos principais fatores causadores das doenças ocupacionais.

“Trabalhadores de diversos campos de atividades estão levando tarefas para o lar e ocupando suas horas de lazer pensando e resolvendo problemas ou mesmo executando tarefas que antes só́ eram feitas no local de trabalho.” – Zanelli

O sistema nervoso não é muito bom em distinguir entre ameaças emocionais e físicas. Quando o indivíduo fica superestressado com uma discussão com um amigo, com um prazo de trabalho ou com um monte de notas, o corpo poderá reagir com tanta força quanto se estivesse enfrentando uma verdadeira situação de vida ou morte. E quanto mais o sistema de estresse de emergência for ativado mais fácil será o acionamento, dificultando o desligamento. Quando ocorrem picos de estresse com frequência, o corpo tende a permanecer em um estado elevado de estresse na maioria das vezes. E isso pode levar a sérios problemas de saúde. O estresse crônico interrompe quase todos os sistemas do corpo. Ele pode suprimir o sistema imunológico, perturbar os sistemas digestivo e reprodutivo, aumentar o risco de ataque cardíaco e derrame e acelerar o processo de envelhecimento. Pode até religar o cérebro, deixando-o mais vulnerável à ansiedade, depressão e outros problemas de saúde mental.

“Pessoas cronicamente ansiosas ou com problemas psicossomáticos possuem um padrão específico de reação ao estresse: o corpo se mobiliza para enfrentar o desafio e não consegue parar quando cessa o problema. A tensão inicial é necessária, pois permite que a pessoa concentre sua energia e percepção para lidar com uma ameaça em potencial. Mas, passado o perigo, o corpo deveria relaxar, recuperando as energias gastas e reunindo forças para enfrentar o próximo estresse. Uma pessoa ansiosa enfrenta os acontecimentos normais da vida como se eles fossem crises. Cada pequeno acontecimento aumenta a sua tensão, e essa tensão, por sua vez, transforma o acontecimento normal seguinte – um prazo, uma entrevista, uma consulta médica – em uma ameaça. Porque, como o corpo de uma pessoa ansiosa permanece mobilizado após ter transcorrido um acontecimento mobilizante, ela fica com menos defesa contra a ameaça do seguinte. Se voltasse ao estado de relaxamento, essa pessoa transporia mais facilmente o segundo acontecimento.” – Daniel Goleman

A SÍNDROME DE BURNOUT

Mulher de cabeça baixa na mesa do trabalho.
Foto: 123rf.

A síndrome de burnout ou síndrome do esgotamento profissional é uma doença que vem assolando cada vez mais trabalhadores. Burnout significa se queimar por completo: “to burn out”, em inglês.

Os sintomas da síndrome de burnout se caracterizam pela exaustão emocional por meio da fadiga, irritabilidade, propensão a acidentes, sinais de depressão e ansiedade, cansaço excessivo, tanto físico quanto mental, surgimento de doenças psicossomáticas, baixa autoestima, sensação de não dar conta da demanda, ausência no prazer de viver, angústia, isolamento social, insônia, dificuldade de concentração, dores musculares, problemas gastrointestinais, alterações no apetite e nos batimentos cardíacos.

O termo “burnout” foi denominado assim pela primeira vez pelo psicanalista alemão Herbert J. Freudenberger, no ano de 1974.

SAÚDE E TRABALHO

Mulher sorrindo com xícara de café na mão.
Foto: 123rf.

Ter satisfação no trabalho é um assunto complexo e de complexa definição. Boa parte da dificuldade procede de a satisfação, ou o contentamento, no trabalho ser uma condição subjetiva no qual a satisfação com determinada situação ou ocasião pode variar de indivíduo para indivíduo, de ocasião para ocasião, ao longo dos tempos, até mesmo para a mesma pessoa e estar sujeita a influências de forças internas e externas ao ambiente de trabalho imediato.

De acordo com Zanelli e outros autores, a aceitação dos valores organizacionais por parte dos colaboradores é de extrema importância para a consolidação da cultura. Quando existe incompatibilidade entre os valores pessoais e os organizacionais, as condições para o estresse emocional podem ser favorecidas.

Do estilo de vida à genética, bem como as condições ambientais favoráveis no local em que se vive, estes são os principais responsáveis por uma vida saudável.

Qualidade de vida implica satisfação das necessidades e expectativas. Ambas têm bases nas relações interpessoais, no exercício do poder, no encaminhamento dos conflitos, na cooperação e nas possibilidades de aprendizagem e desenvolvimento pessoal.

A MEDITAÇÃO COMO COMPLEMENTO

Homem meditando em mesa de trabalho.
Foto: 123rf.

“A pessoa que medita regularmente lida com o estresse de modo a romper a espiral da reação de enfrentamento ou fuga. Ela relaxa com muito mais frequência do que a que não medita, após um desafio ter sido superado. Isso faz com que seja improvável que ela encare como nocivas ocorrências inocentes. Ela percebe a ameaça com mais exatidão e reage com a mobilização somente quando necessário. Após a mobilização, a recuperação rápida a torna menos predisposta a encarar o próximo compromisso como uma ameaça, como acontece com uma pessoa ansiosa.” – Daniel Goleman

Atualmente um número crescente de médicos utiliza a meditação como complemento do tratamento de distúrbios, como a hipertensão, dores de cabeça, dores nas costas, problemas de ansiedade e para controlar ou diminuir dores crônicas.

De acordo com uma publicação do “Washington Post”, Sara Lazar, neurocientista do Massachusetts General Hospital e da Harvard Medical School, foi uma das primeiras cientistas a tomarem as alegações anedóticas sobre os benefícios da meditação e atenção plena e testá-las em exames cerebrais. O que ela descobriu a surpreendeu – que meditar pode literalmente mudar seu cérebro.

Em sua pesquisa, Lazar conta que o primeiro estudo analisou meditadores de longo prazo versus um grupo de controle. Eles descobriram que os meditadores de longo prazo têm uma quantidade aumentada de substância cinzenta nas regiões ínsula e sensorial, no córtex auditivo e sensorial. O que faz sentido. Segundo Lazar, quando se está atento, está prestando atenção na respiração, aos sons, na experiência do momento presente, fechando a cognição. Dessa forma, os sentidos seriam reforçados. Lazar complementa que a descoberta de mais massa cinzenta no córtex frontal está associada à memória de trabalho e à tomada de decisões executivas.

“A atenção plena é como um exercício. É uma forma de exercício mental, realmente. E, assim como o exercício aumenta a saúde, ajuda a lidar melhor com o estresse e promove a longevidade; a meditação pretende conferir alguns desses mesmos benefícios. Mas, assim como o exercício, não pode curar tudo. Portanto, a ideia é que seja útil como terapia complementar. Não é autônoma. Foi testada com muitos outros distúrbios e os resultados variam tremendamente. Os resultados às vezes são modestos. E isso não funciona para todos.” – Sara Lazar

Outro estudo conduzido pelo doutor Madhav Goyal, médico especialista em medicina interna do estado da Califórnia, EUA, o qual foi realizado na Universidade americana John Hopkins, teve como objetivo determinar a eficácia dos programas de meditação na melhoria dos resultados relacionados ao estresse, ansiedade, depressão, angústia, humor positivo, qualidade de vida relacionada à saúde mental, atenção, uso de substâncias, hábitos alimentares, sono, dor e peso em diversas populações clínicas de adultos.

Segundo Suzana Petropouleas (2019), o estudo realizou revisão sistemática e meta-análise de 17.801 citações e 47 testes com 3.320 participantes sobre programas de meditação para redução de estresse e promoção de bem-estar. Concluíram que programas de mindfulness de oito semanas têm evidências moderadas de auxílio na redução da ansiedade, depressão e dor. Entretanto, as evidências de que tais protocolos ajudem na redução de estresse e qualidade de vida em termos de saúde mental foram consideradas baixas.

“Marcelo Demarzo é doutor em patologia pela USP e professor da Escola Paulista de Medicina (Unifesp). Ele defende a prática como tratamento complementar de condições como ansiedade, depressão e dores crônicas. “As principais técnicas para o desenvolvimento da atenção plena são exercícios atencionais derivados de algumas práticas meditativas que usam o próprio corpo (respiração, sensações corporais) como âncoras para o treinamento da atenção”, relata. “Podemos mapear os benefícios de mindfulness de várias maneiras: por escalas psicológicas, avaliações sanguíneas, avaliações neurobiológicas ou cerebrais e por exames de ressonância magnética funcional”. – Suzana Petropouleas

Outra pesquisa realizada por pesquisadores da Universidade de Alberta, Canadá, chegou à conclusão de que a caracterização dos componentes universais ou suplementares das práticas de meditação foi impedida pela heterogeneidade teórica e terminológica entre as práticas, pois evidências sobre o estado da pesquisa nas práticas de meditação foram fornecidas em 813 estudos predominantemente de baixa qualidade.

O papel dos modificadores de efeito nas práticas de meditação foi negligenciado na literatura científica. Os efeitos fisiológicos e neuropsicológicos das práticas de meditação foram avaliados em 312 estudos de baixa qualidade. Meta-análises de resultados de 55 estudos indicaram que algumas práticas de meditação produziram mudanças significativas em participantes saudáveis.

Todavia, no ambiente corporativo, as práticas de meditação têm sido cada vez mais adotadas como uma ferramenta para impulsionar desempenho e qualidade de vida.

“O interesse tem crescido tanto que grandes corporações têm seus próprios programas – é o caso do programa Search Inside Yourself (busque dentro de você), do Google, criado em 2007 por experts em mindfulness, neurociência e inteligência emocional como um treinamento interno para os funcionários – e hoje disponível em mais de 30 países.” – Suzana Petropouleas

A prática da meditação como tratamento complementar de condições provenientes da ansiedade, depressão e dores crônicas também é defendida por Demarzo (2019), tendo como uma das principais técnicas para o desenvolvimento da atenção plena os exercícios derivados de alguns métodos meditativos que usam o próprio corpo como âncoras para o treinamento da atenção.

Dois homens e uma mulher meditando.
Foto: 123rf.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após pesquisas realizadas por médicos e cientistas, podemos dizer que a meditação pode ser praticada como complemento à saúde dos colaboradores presentes nos escritórios corporativos.

Vale ressaltar que complemento é um suplemento a algo. Ou seja, algo complementar à saúde não se trata de um tratamento autônomo capaz de reestabelecer a cura do indivíduo de forma integral, mas sim de auxiliá-lo no tratamento ou reabilitação de sua saúde combinados à medicina alopática, alimentação saudável, práticas de atividades físicas, meditação, entre outros.

Todavia, a meditação ainda é um campo a ser explorado e melhor aprofundado em estudos científicos, e para isso são necessárias mais e melhores pesquisas para determinar os reais efeitos desses programas.

No que tange às organizações, temas relacionados ao estresse dentro das empresas carecem ser melhores discutidos e encarados como responsabilidades dos gestores tanto dos departamentos internalizados e da macrogestão da organização, a fim de trazer novos esclarecimentos e possibilidades como formas de prevenir e combater o estresse causado pelo ambiente corporativo.

Outrossim, é necessário promover a saúde, utilizando estratégias eficazes na divulgação e conscientização por meio dos processos educativos e de desenvolvimento do autocontrole, para os colaboradores

REFERÊNCIAS
ZANELLI, José Carlos e Colaboradores. “Estresse nas Organizações de Trabalho: Compreensão e Intervenção Baseadas em Evidências”. Porto Alegre: Artmed. 2010.

PETROPOULEAS, Suzana. “Meditação: O Que a Ciência Diz sobre Práticas como o Mindfulness”. Reportagem, Dossiê 205. Mar. 2019. Disponível em: < http://www.comciencia.br/meditacao-o-que-ciencia-diz-sobre-praticas-como-o-mindfulness/>. Acesso em: 7 de nov. de 2019.

LAZAR, Sara W. et al. “Meditation Experience Is Associated with Increased Cortical Thickness”. Published in final edited form as: nov. 2005. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1361002/>. Acesso em 13 de nov. de 2019.

LAZAR, Sara W. et al. “Mindfulness Practice Leads to Increases in Regional Brain Gray Matter Density”. Published in final edited form as: jan. 2011. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3004979/>. Acesso em 13 de nov. de 2019.

OSPINA, MB, BOND K, KARKHANEH M, TJOSVOLD L, VANDERMEER B, LIANG Y, BIALY L, HOOTON N, BUSCEMI N, DRYDEN DM, KLASSEN TP. “Meditation Practices for Health: State of the Research”. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/17764203>. Acesso em: 14 de nov. de 2019.

GOYAL, Madhav, MD, MPH; SINGH, Sonal, MD, MPH; SIBINGA, Erica M.S, MD, MHS; et al. “Meditation Programs for Psychological Stress and Well-Being. A Systematic Review and Meta-Analysis”. Disponível em: < https://jamanetwork.com/journals/jamainternalmedicine/fullarticle/1809754>.Acesso em 14 de nov. de 2019.

Sobre o autor

Giselli Duarte

Nunca fui alguém que se contenta em observar a vida passar. A inquietação sempre pulsou em mim, guiando-me a atravessar caminhos diversos, por vezes improváveis, mas sempre significativos. Não se tratava de buscar respostas rápidas, mas de me deixar ser moldada pelas perguntas.

Meu primeiro contato com o trabalho foi aos 14 anos. Não era apenas sobre ganhar meu próprio dinheiro, mas sobre entender como o mundo se movia, como as relações de troca iam além de cifras. Com o tempo, percebi que meu lugar não seria apenas cumprir horários, mas criar algo próprio. Assim, aos 21, nasceu meu primeiro negócio, registrado formalmente. Desde então, empreender tornou-se tanto profissão quanto paixão.

Mas, por trás dessa trajetória profissional, sempre existiu uma busca interior que muitas vezes precisei calar para priorizar o mundo exterior. Foi somente quando o cansaço me alcançou na forma de burnout que entendi que não podia mais ignorar a necessidade de olhar para dentro. Yoga e meditação não foram apenas escapes, mas verdadeiras reconexões com uma parte de mim que havia sido negligenciada.

Foi nesse espaço de silêncio que descobri o quanto a curiosidade que sempre me guiou podia ser dirigida também para dentro. Formei-me em Hatha Yoga, dentre outras terapias integrativas, e comecei a dividir o que aprendi com outras pessoas, conduzindo práticas e compartilhando reflexões em plataformas como Insight Timer e Aura Health. Ensinar, percebi, é uma das formas mais puras de aprender.

A escrita foi um desdobramento natural desse processo. Sempre acreditei que as palavras possuem a capacidade de transformar não só quem as lê, mas também quem as escreve. Meus livros, No Caminho do Autoconhecimento e Lado B, são registros de uma caminhada que não se encerra, mas que encontra sentido na partilha. Participar de antologias poéticas também me mostrou a força do coletivo, de somar vozes em algo maior.

Cada curso que fiz, cada desafio que enfrentei, trouxe peças para um mosaico em constante formação. Marketing, design, gestão estratégica – cada aprendizado me preparou para algo que, na época, eu ainda não conseguia nomear. Hoje, entendo que tudo se conecta.

Minha missão não é ensinar verdades absolutas, mas oferecer ferramentas para que cada pessoa possa encontrar suas próprias respostas. Seja através da meditação, da escrita ou de uma simples conversa, acredito que o autoconhecimento é um processo contínuo, sem fim, mas cheio de significado.

E você, o que tem feito para ouvir as perguntas que habitam em você? Talvez nelas esteja o próximo passo para um novo horizonte.

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Meditação para quem não sabe meditar

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