Convivendo Espiritualidade

Minha experiência como voluntária no Templo Budista Kadampa

Escrito por Giselli Duarte

Em setembro de 2016, senti um chamado profundo para me voluntariar em um templo budista. Foi assim que, com um colega, decidi partir para o Centro de Meditação Kadampa, em Cabreúva–SP. Sem muita ideia do que nos esperava, com apenas o desejo de vivenciar algo novo, nos inscrevemos e colocamos o pé na estrada, rumo ao desconhecido. Nenhum de nós sequer tinha estado em Cabreúva antes.

Tudo o que eu sentia era essa vontade, esse impulso que não podia ser ignorado.

Acordamos cedo, às cinco da manhã. Tomamos um café rápido e pegamos o carro. A estrada parecia conspirar para nos oferecer uma experiência extraordinária, como se soubesse que aquele fim de semana seria inesquecível. Enquanto viajávamos, o sol nascia lentamente no horizonte. A cada quilômetro que nos aproximávamos do nosso destino, a natureza se mostrava cada vez mais vibrante e bela — o céu ganhava cores deslumbrantes e a paisagem ao redor se tornava quase mágica.

Ao chegarmos ao portão de entrada do templo, a primeira coisa que senti foi uma profunda sensação de paz. Havia uma atmosfera única naquele lugar, uma mistura de silêncio acolhedor e energia positiva que parecia circundar tudo. Foi um daqueles momentos em que você simplesmente sabe que está no lugar certo.

Assim que chegamos, já começamos nossa hospedagem com trabalho voluntário, renovando as oferendas a Shakyamuni Buda. Esse trabalho era quase uma meditação em si, uma prática de atenção plena. Lidar com potes de cristal e água exigia cuidado e foco, o que, para mim, era um desafio constante. Sempre fui um pouco desastrada — já perdi a conta de quantos copos, louças e cristais quebrei ao longo da vida. Mas ali, cada movimento era feito com uma intenção especial, quase sagrada.

Ao final de cada tarefa no templo, um mantra era cantado, falado ou mentalizado, em devoção e vacuidade. E isso dava um sentido tão especial ao trabalho, como se cada pequena ação tivesse um propósito maior.

Depois de concluir essa primeira atividade, fui para a cantina, onde conheci a Kika — uma mulher incrível! Ela era cantora de MPB, mãe, e tinha uma risada que contagiava a todos ao redor. Kika também era voluntária do templo, e fazia tudo por amor, com o coração cheio de generosidade. Passei grande parte da minha estada ao lado dela, e aprendi muito em cada momento.

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Giselli e Kika

Na cantina, minha próxima tarefa era lavar os banheiros. Nunca imaginei que poderia lavar banheiros com tanto carinho e dedicação. Mas ali, tudo o que fazíamos tinha um propósito maior — cada ação era a serviço do amor, da compaixão e dos Budas. No templo, todo o trabalho é voluntário, e isso cria uma atmosfera de gratidão e serviço que transforma até mesmo as tarefas mais simples em algo significativo.

Após um intervalo, começaram as aulas sobre o budismo, ministradas pelo monge residente, Gen Kelsang Tsultrim. Cada aula iniciava com uma meditação, e eu me sentia como uma criança, curiosa e atenta a tudo o que o monge dizia. Os ensinamentos eram tão práticos, tão aplicáveis ao nosso dia a dia, que era impossível não se sentir tocada por eles. Cada palavra parecia trazer um novo entendimento, uma nova forma de ver o mundo.

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Giselli e Monge Tsutrim

Sem sabermos, fomos ao templo em um fim de semana especial. A cada duas semanas, acontece a Oferenda ao Guia Espiritual, e tivemos a sorte de participar da organização, das contribuições e da cerimônia principal. Foi uma experiência de entrega e devoção que nunca vou esquecer.

Depois da cerimônia, alguns voluntários combinaram de se encontrar às 6h30 da manhã seguinte para uma meditação matinal ao lado da árvore Bodhi. Sem hesitar, confirmei minha presença. E lá estava eu, pela primeira vez na vida, meditando ao lado de uma Bodhi Tree, com o sol nascendo por trás das montanhas da Serra do Japi. Foi um momento de pura magia, de conexão profunda com a natureza e com algo maior que não consigo descrever em palavras.

Após a meditação, tomamos café e iniciamos outra aula do curso “Liberte-se da Dor e do Sofrimento”, sobre o “Caminho Rápido ao Grande Êxtase”. Eu estava totalmente imersa, absorvendo cada ensinamento como se fosse uma joia preciosa.

Voltando aos trabalhos na cantina, já me sentia parte daquele lugar. Estava familiarizada com tudo e com todos, até mesmo com as aranhas que habitavam o templo. Quem me conhece sabe o medo que sempre tive delas, mas ali, após uma conversa quase filosófica com um monge e outro budista durante o almoço, comecei a vê-las de forma diferente. Passei a enxergar as aranhas como seres que, assim como nós, têm suas famílias, cuidam de seus filhos, sentem e vivem. A diferença entre nós era apenas a espécie — e, claro, o fato de eu ainda não ser mãe (risos).

No domingo, o templo ficou mais movimentado, com muitos visitantes chegando para a visita monitorada. Foi incrível poder atender tantas pessoas na cantina, trocar olhares, palavras e gentilezas. Cada encontro, por menor que fosse, parecia carregado de significado e humanidade.

Ao final do dia, me dirigi ao templo para participar das Preces pela Paz Mundial. Sabia que aquele fim de semana especial estava chegando ao fim, e fui tomada por um sentimento profundo de acolhimento e amor. Não há palavras suficientes para traduzir tudo o que vivenciei ali — são momentos que acontecem no coração e ficam gravados na alma. Mas posso dizer que senti uma felicidade plena, uma sensação de estar exatamente onde deveria estar, em completa harmonia.

Conhecer novas pessoas, ouvir suas histórias, estar naquele templo cheio de paz e aprender diretamente de um monge budista foram experiências que vou levar para sempre. Havia tanta presença e tanta conexão em cada detalhe daquele lugar.

O mais incrível de tudo é que qualquer pessoa pode se voluntariar, conhecer o templo, participar dos cursos e das meditações. Basta se inscrever no site, assim como eu fiz.

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Posso dizer, sem dúvida, que foi uma das experiências mais belas que já tive. Sou profundamente grata a cada pessoa que me acolheu com tanto carinho. E, como dizia Buda: “Não acreditem no que eu digo, testem por si próprios.”

Gostaria de compartilhar com você a Prece Libertadora, Louvor a Buda Shakyamuni, que recitamos durante todos aqueles dias no templo. A melodia é linda, e você pode encontrá-la no YouTube ou Spotify.

A letra diz assim:

Ó abençoado Shakyamuni Buda,
precioso tesouro de compaixão,
concessor de suprema paz interior,
tu amas todos os seres sem exceção.
És fonte de bondade e felicidade
e nos guias ao caminho libertador.
Teu corpo é uma joia dos desejos,
tua fala é um néctar
purificador e supremo,
e tua mente refúgio para todos os seres vivos.
Com as mãos postas me volto para ti,
amigo supremo e estável,
e peço do fundo do meu coração:
por favor, concede-me a luz da tua sabedoria
para dissipar a escuridão da minha mente
e curar o meu contínuo mental.
Por favor, nutre-me com a tua bondade
para que eu possa, por minha vez, nutrir todos os seres
com um incessante banquete de deleite.
Por meio de tua compassiva intenção,
de tuas bênçãos e feitos virtuosos,
e por meu forte desejo de confiar em ti,
que todo sofrimento rapidamente cesse,
que toda felicidade e alegria aconteçam,
e que o santo Darma floresça para sempre.

Namastê.

Sobre o autor

Giselli Duarte

Nunca fui alguém que se contenta em observar a vida passar. A inquietação sempre pulsou em mim, guiando-me a atravessar caminhos diversos, por vezes improváveis, mas sempre significativos. Não se tratava de buscar respostas rápidas, mas de me deixar ser moldada pelas perguntas.

Meu primeiro contato com o trabalho foi aos 14 anos. Não era apenas sobre ganhar meu próprio dinheiro, mas sobre entender como o mundo se movia, como as relações de troca iam além de cifras. Com o tempo, percebi que meu lugar não seria apenas cumprir horários, mas criar algo próprio. Assim, aos 21, nasceu meu primeiro negócio, registrado formalmente. Desde então, empreender tornou-se tanto profissão quanto paixão.

Mas, por trás dessa trajetória profissional, sempre existiu uma busca interior que muitas vezes precisei calar para priorizar o mundo exterior. Foi somente quando o cansaço me alcançou na forma de burnout que entendi que não podia mais ignorar a necessidade de olhar para dentro. Yoga e meditação não foram apenas escapes, mas verdadeiras reconexões com uma parte de mim que havia sido negligenciada.

Foi nesse espaço de silêncio que descobri o quanto a curiosidade que sempre me guiou podia ser dirigida também para dentro. Formei-me em Hatha Yoga, dentre outras terapias integrativas, e comecei a dividir o que aprendi com outras pessoas, conduzindo práticas e compartilhando reflexões em plataformas como Insight Timer e Aura Health. Ensinar, percebi, é uma das formas mais puras de aprender.

A escrita foi um desdobramento natural desse processo. Sempre acreditei que as palavras possuem a capacidade de transformar não só quem as lê, mas também quem as escreve. Meus livros, No Caminho do Autoconhecimento e Lado B, são registros de uma caminhada que não se encerra, mas que encontra sentido na partilha. Participar de antologias poéticas também me mostrou a força do coletivo, de somar vozes em algo maior.

Cada curso que fiz, cada desafio que enfrentei, trouxe peças para um mosaico em constante formação. Marketing, design, gestão estratégica – cada aprendizado me preparou para algo que, na época, eu ainda não conseguia nomear. Hoje, entendo que tudo se conecta.

Minha missão não é ensinar verdades absolutas, mas oferecer ferramentas para que cada pessoa possa encontrar suas próprias respostas. Seja através da meditação, da escrita ou de uma simples conversa, acredito que o autoconhecimento é um processo contínuo, sem fim, mas cheio de significado.

E você, o que tem feito para ouvir as perguntas que habitam em você? Talvez nelas esteja o próximo passo para um novo horizonte.

Curso
Meditação para quem não sabe meditar

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