Saúde Mental

Você conhece a técnica da cadeira vazia?

Foto de uma cadeira vazia.
Studio-54 / 123RF
Escrito por Eu Sem Fronteiras

Imagine que você pudesse conversar abertamente com alguma pessoa que teve um papel relevante em algum problema e trauma de sua vida… sem amarras, sem interrupções e sem o medo do olho no olho, que poderia desviar sua atenção quanto a tudo que você desejaria dizer.

Ou, ainda, imagine se fosse possível falar com alguém que não está mais aqui, para desabafar sobre tudo aquilo que ficou guardado, que não foi dito por medo ou falta de tempo! Pois é isso que propõe a técnica da cadeira vazia, uma das ferramentas mais conhecidas da Gestalt-terapia, sendo utilizada na terapia cognitivo-comportamental (TCC).

Mas aí você deve estar se perguntando: o que é Gestalt-terapia?

Bem, a Gestalt-terapia ou Abordagem Gestáltica é uma abordagem psicoterapêutica que tem por objetivo ajudar o indivíduo por meio de seus sentimentos e percepções atuais, ou seja, é uma terapia centrada no indivíduo e no momento presente dele.

Não devemos confundir Gestalt-terapia com a Psicologia da Gestalt (ou Psicologia da Forma). Esta é um conjunto de estudos sobre a nossa forma de perceber as coisas, que foca a ideia de que o todo é mais do que a mera soma de suas partes. É um recurso bastante utilizado em design, por exemplo.

Ambas as teorias surgiram na Alemanha. A palavra “Gestalt” não possui um correspondente em outras línguas, tendo uma tradução aproximada, em nosso idioma, para “forma” ou “figura”, estando associada ao processo de surgimento de figura-fundo. A Psicologia da Gestalt foi uma das teorias que influenciaram a Gestalt-terapia, justamente com relação a essa associação de figura-fundo, que, na abordagem terapêutica, ganhou uma ampliação de sentido.

Desenho de mãos abertas e estendidas. O desenho é todo colorido e verde, azul, roxo, amarelo e rosa.
Tim Mossholder / Unsplash

A Gestalt-terapia foi desenvolvida pelos alemães Fritz Perls e Laura Perls e pelo norte-americano Paul Goodman, teóricos e psicoterapeutas do século XX.

Para a Gestalt-terapia, os transtornos são considerados uma parte de nós que precisa ser desenvolvida. Segundo essa prática, por meio da associação de práticas cognitivas e nossas emoções, nos tornamos capazes de enxergar novas formas de lidar com as adversidades da vida.

A Abordagem Gestáltica pode ser usada com crianças, adolescentes, famílias, indivíduos, casais. Pode ocorrer a prática em grupo ou individual e é uma grande coadjuvante para problemas com autoestima, sexualidade, luto, autoconfiança. Também tem um papel relevante nas questões relacionadas com depressão, estresse, ansiedade, psicopatologias infantis, dentre outras. Dentre as técnicas realizadas, as principais são: dramatização, discussão dos sonhos, diálogos, expressões não verbais e a cadeira vazia, com a qual iniciamos este artigo.

O que é a técnica da cadeira vazia?

A técnica da cadeira vazia é uma tentativa de reproduzir um encontro com uma situação, pessoa, para que se possa dialogar com uma delas, estabelecendo contato emocional com o evento que causou todos os conflitos e transtornos.

Constitui-se de uma técnica psicodramática chamada role playing (interpretação de papéis), em que o indivíduo se senta em frente a uma cadeira vazia e imagina nela a pessoa-alvo que tenha tido um papel relevante nesse evento com o qual ele está tentando se conectar.

O objetivo desse exercício é que sejam colocados todos os pingos nos is sobre as situações que levaram ao trauma, impasse ou ressentimento, trazendo uma resolução e uma conclusão para o fato. É uma técnica muito útil no tratamento de estresse pós-traumático.

A técnica, passo a passo

A terapia com a cadeira vazia normalmente envolve três cadeiras: a do paciente, a do terapeuta e uma terceira, vazia, que representa a pessoa, fato, sentimento ou mesmo uma parte de si, com o qual ele vai resolver determinada situação.

São seguidas várias etapas:

  • Fase preparatória: a cadeira vazia é posicionada de frente para o paciente. Pode ser colocada também na diagonal, para evitar oposições.
  • Segunda fase: o paciente informa o que ou quem ele está projetando, a projeção com a qual ele vai dialogar.
  • Terceira fase: o paciente faz uma descrição da projeção desse interlocutor imaginário, com o objetivo de fortalecer a figura dele. Devem ser ressaltados os aspectos positivos e negativos.
  • Fase de expressão verbal: é aqui que o paciente inicia o diálogo, dirigindo-se à projeção que ele detalhou nas fases anteriores. Nesse ponto da terapia, ele precisa colocar para fora tudo que não conseguiu no momento em que o fato ocorreu. Aqui é fundamental a mediação do terapeuta para que o processo não traga um resultado contrário ao desejado, como uma piora no trauma, mas sem interferir no fluxo de pensamentos do paciente. O terapeuta também leva o paciente a uma reflexão sobre tudo que ele sentiu e expressou, para que ele possa identificar suas emoções e reações, para ter uma noção de como os fatos ocorridos interferem em sua vida.
  • Conclusão: essa fase finaliza a técnica. Aqui o paciente é orientado a fechar os olhos e imaginar novamente a presença de seu interlocutor imaginário, para então extinguir todas as imagens que ele criou e dar forma a um novo esquema funcional.

Mas é preciso comprometimento

Como a Gestalt-terapia foca o momento presente, o aqui e o agora, a cadeira vazia não tem a pretensão de trazer uma reflexão sobre o passado em si. Até porque o que passou não pode ser mudado. Mas o principal foco é a possibilidade de o paciente expressar tudo aquilo que não pôde no momento do evento. Dessa forma, ele pode ressignificar o fato, para poder seguir em frente, com a sensação de um ciclo encerrado.

E, também, como essa técnica não traz o interlocutor original desse fato, é bem certo que o desfecho está muito longe do que seria se fosse uma conversa real, já que uma outra pessoa implica uma outra personalidade e, consequentemente, reações provavelmente muito distintas. Mas como falamos, o foco da Abordagem Gestáltica é a pessoa que está sentindo. Então, só a oportunidade de desabafar, de colocar tudo para fora, já é uma grande ajuda para o estado emocional dessa pessoa.

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E, sendo o paciente o verdadeiro foco dessa abordagem, é necessário um grande comprometimento de sua parte, além de uma habilidade para imaginar e moldar a sua projeção, de forma que a “interação” seja eficiente, a ponto de ser capaz de extrair todas as emoções que ficaram suprimidas no tempo em que o fato ocorreu.

É preciso também ter muita resiliência e dedicação, tanto do paciente como do terapeuta, para que o tratamento – que demanda tempo e esforço – caminhe para o sucesso e traga realmente uma boa perspectiva na forma de lidar com sentimentos e emoções, além de proporcionar uma ressignificação real dos eventos que afetam as suas emoções até o momento presente.

A partir do momento em que você conseguir desengasgar todas as emoções que estavam te corroendo até então, você verá que existe uma perspectiva muito diferente sobre a vida. E, fazendo esse exercício com uma situação passada, você perceberá que, daqui pra frente, falar o que sente pode ser libertador.

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