Comportamento Psicologia

Episódio VI – A conturbada relação de uma aranha e sua mosca : Aprendendo a lidar com portadores do Transtorno de Personalidade Narcisista Episódio 6

Uma mulher olhando-se no espelho.
kitzzeh / Shutterstock

Manipuladores podem indistintamente ser homens ou mulheres, pais, mães, irmãos, amigos, empregadores, colegas de trabalho ou relações de qualquer outro tipo. Apenas para facilitar a compreensão, vamos usar como exemplo a situação de um homem que tem uma mulher como alvo de sua manipulação pois, além de se mostrar como o modelo mais clássico, é um dos mais difíceis de libertação para a vítima, principalmente quando já envolvidos numa relação de longo prazo, como em um casamento ou namoro. Esse tipo de vítima, diga-se de passagem, é a que normalmente mais precisa de cuidados, por isso foi escolhida para ilustrar este texto. Se é o seu caso, então a primeira coisa que precisa ter em mente no convívio com o manipulador é que ele sempre pensa apenas nem si mesmo. Você não passará de um objeto de seu uso e só estará ali enquanto for interessante para ele. No momento que passar a não ser, não tenha dúvida de que ele tentará se livrar de você, pois sua presença começará a incomodá-lo bastante. O antídoto? Mesmo que você seja a pessoa mais generosa do mundo, volte sua atenção também para si mesma.

Não se descuide das precauções que precisa adotar e nem caia na armadilha da autodesvalorização, pois essa será a bala mais letal das metralhadoras de seu narcisista de estimação para atingi-la por todos os lados. Escude-se bem, pois essa é a palavra. Crie fortes defesas contra agressões que terão como principal objetivo colocar você para baixo e mostrar que não é capaz de coisa alguma sem a ajuda dele. Reforce continuamente cada fragilidade de sua autoestima, valorize-se e, no tocante ao lado prático da questão, busque uma forma de se manter por si mesma. A ausência de autonomia será uma grande vulnerabilidade para que se mantenha dependente do manipulador e não alimente dúvidas de que ele fará de tudo para que você não consiga andar com as próprias pernas. E, nesse aspecto, ele vai até fingir ajudá-la a buscar emprego, mas caso o consiga vai detonar todas as suas chances de permanecer nele. Se não conseguir demovê-la internamente, vai dar um jeito para que a despeçam. Então, prepare-se e, se possível, mantenha seu trabalho bem longe das garras de seu narcisista de plantão!

Mãos manipulando as cordas de um fantoche.
AndreyPopov de Getty Images / Canva

A chantagem emocional é outra arma quase invariável dos manipuladores. Não será novidade ele fazer o uso dela sempre que se descobrir perdendo a batalha. Alguns, dependendo do temperamento mais típico, fazem-se de “coitadinhos” e dependentes de você para convencê-la de que seria impossível dividir seu tempo entre eles e seu trabalho. Há, porém, outros orgulhosos demais para isso, pois acham que com tal postura perdem poder, principalmente aqueles de temperamento agressivo e que a tratam como sua propriedade. Esses farão uso da chantagem de uma forma diferente, fazendo com que você se sinta culpada em relação aos “filhos que está abandonando”, aos pais velhinhos que precisam de seus cuidados ou até aos “pets” que ficam em sérios problemas com você diariamente fora de casa. Muito cuidado com isso! Se está pensando seriamente em arranjar um trabalho fora, trate de planejar como vai “dividir a atenção” diante desses argumentos usados para que você não trabalhe, contratando os serviços de alguém ou buscando uma outra solução qualquer. Em qualquer caso, lembre-se de que a solução compete AOS DOIS, e não só a você, e diga-lhe que precisam encontrar uma solução que funcione, pois que você não desistirá de sua autonomia de escolha.

Ele perceberá, então, que você está falando sério e provavelmente se colocará “disposto a ajudá-la, pois tudo o que quer é deixa-la feliz” e essa estratégia costuma funcionar em muitos casos. Assim, ele “fará de tudo“ para que você realize seu desejo, empenhando-se pessoalmente para que obtenha êxito. Vai se oferecer para acompanhá-la em sua procura por emprego e não estranhe se ele até faltar do próprio trabalho apenas para isso. Bonzinho ele, não é? E que mudança, não é mesmo? Mas a realidade é bem outra, posi tudo o que ele quer é conhecer suas chances reais de se empregar e, caso tenha alguma, saber onde e com quem estará lidando, de modo que possa “detonar” tudo tão logo assim que você assume a vaga. E isso inclui tornar a vida de seus empregadores tão complicada depois de sua contratação que, para se verem livres do problema, não lhes restará alternativa senão demiti-la! Portanto, não trate esse quesito apenas como mais um item de prevenção ou igual aos demais: dê-lhe prioridade absoluta na sua ordem de ações para fugir do manipulador, pois mais à frente precisará do emprego e entenderá sua importância como meio de sobrevivência ao conviver com uma pessoa manipuladora. Esse item é tão essencial que mais à frente voltaremos a falar no assunto, quando você então terá oportunidade de entender melhor seus porquês. Outra arma comumente usada por eles é a forma indireta de “afirmar” qualquer coisa. Ele sempre escorrega para um “vamos ver”, “pode ser” ou “talvez”, pois estarão sempre buscando formas de não se comprometerem com qualquer promessa. Sendo assim, não fique esperando por uma resposta objetiva diante de algo que precise e parta para buscar as suas respostas sem esperar por ajuda.

E se ainda lhe restar dúvidas com relação ao real perfil de seu parceiro, um sintoma que não falha na identificação de um manipulador é o fato de que ele nunca se acha errado para pedir desculpas. Não importa o que faça, nem a gravidade da ação, o manipulador nunca se retrata sinceramente ou se declara arrependido pelo que fez, a menos que seja apenas para “apagar o fogo” e voltar à carga depois. Ele fará uso de uma justificativa para suas ações e a desculpa preferencial dele será sempre você. Ele fez aquilo porque VOCÊ provocou. Ele acaba perdendo a paciência porque VOCÊ o agride. Ele teve a aventura fora de casa porque VOCÊ não lhe dá o que precisa e até parte para agredi-la porque é a única forma de contê-la etc., etc. Assim, ele sempre será o “Chapeuzinho Vermelho” de quem precisa se defender do “Lobo Mau” pelas coisas terríveis que você faz contra ele.

Tenha em mente também que sua vontade nunca será considerada em coisa alguma, pois a dele, por definição, vai prevalecer sempre.

Dedos indicador e médio de uma pessoa girando dois dados. Na imagem veem-se, no total, 6 dados. Antes de serem girados, eles formam a sequência "we want". Se virados, formam a sequência "i want".
Fokusiert de Getty Images / Canva

A sua vontade é um mero desdobramento do que ELE quer e “você poderá fazer tudo o que quiser” desde, é claro, que sua vontade seja igual à dele. Tome nota disso em seu caderninho e leia as anotações muitas vezes para não se esquecer desse detalhe. Para ele, você não é uma pessoa: é apenas um fantoche ou um espelho para refletir a vontade dele até para o que lhe diga respeito. No seu lado mais “generoso”, ele tratará você como uma “bonequinha de luxo”, fazendo-lhe afagos para mostrar o quanto está preocupado em agradá-la e protegê-la, desde que você continue se comportando como uma boneca com “cérebro de ameba desidratada” e ele continue decidindo tudo “o que é melhor para você”.

Quando você estiver atingindo seu limite, ele vai buscar convencê-la de que as coisas não são tão complicadas quanto parecem, ressaltando as tantas vezes em que “abre mão” de algo a seu favor e “muda” as coisas que você diz incomodá-la. Então, anote esta também: ele pode até mudar, sim, mas apenas quando já conseguiu descobrir um interesse novo por trás da mudança. Se ele percebeu, por exemplo, que pode obter uma vantagem ainda maior deixando que você execute sua ideia do que oferecendo resistência a ela. E não será porque entendeu o seu lado, mas porque descobriu nela uma forma de resolver um problema dele próprio. Um exemplo só para ilustrar: se ele descobriu uma nova vítima para seduzir, saber que você estará ocupada com seu trabalho será tudo o que vai precisar para colocar todo o foco na “mosca nova” que acabou de cair em sua teia e ter você por perto seria um empecilho para que o conseguisse. Então, por algum tempo pelo menos, você terá plena confiança de que seu manipulador favorito “se conformou” e aceitou sua vontade de ter um trabalho, visto que a deixará livre de pressão durante todo o tempo necessário para seduzir sua nova vítima.

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Esse tempo, porém, também passará e ele voltará à carga com seu “Plano B” sobre seu trabalho. Agora que você já o consolidou, a meta será desestruturá-lo e mais uma vez jogar por terra todos os seus sonhos. Ah! Só existe uma chance de isso não acontecer: pode ser que ele tenha visto na segunda vítima algo muito maior que lhe interesse e que você não possa lhe proporcionar. E, então, desculpe-me se isso vai dar uma sacudida você e até doer, mas é a hora do “bye-bye”: você chegou ao momento do descarte, pois, a partir de agora, ele trocou seu papel de “bonequinha de luxo” pelo da “pedra no sapato”. “E o que posso fazer quanto a isso?”, você poderá se perguntar. Se a pergunta estiver relacionada à manutenção do relacionamento de vocês, então a resposta é: absolutamente nada! Não existe coisa alguma que você faça para fazê-lo abandonar a outra vítima de modo a continuar com você, não se iluda. Entretanto, se você quer saber como se proteger em vez disso, pense que precisará reforçar seu emocional e, a partir para a luta, não se deixar abater, pois essa é única coisa que você terá a seu favor e que permanecerá sob seu controle. A resposta nua e crua será sempre esta: esteja sempre preparada para essa situação e pronta para retomar as rédeas de sua vida sem a menor dependência de quem quer que seja.

Acompanhe a série:

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Sobre o autor

Luiz Roberto Bodstein

Formado pela Universidade Federal Fluminense e pós-graduado em docência do ensino superior pela Universidade Cândido Mendes. Ocupou vários cargos executivos em empresas como Trimens Consultores, Boehringer do Brasil e Estaleiro Verolme. Consultor pelo Sebrae Nacional para planejamento estratégico e docente da Fundação Getúlio Vargas e do Instituto Brasileiro da Qualidade Nuclear (IBQN) para Sistemas de Gestão. Especializou-se em qualidade na educação (Penn State University, EUA) e desenvolvimento gerencial (London Human Resources Institute, Inglaterra). Atualmente é diretor da Ad Modum Soluções Corporativas, tendo publicado mais de 20 livros e desenvolvido inúmeros cursos organizacionais em suas diferentes áreas de atuação. Conferencista convidado por várias instituições de ensino superior, teve vários de seus artigos publicados em revistas especializadas e jornais de grande circulação, como “O Globo”, “Diário do Comércio” e “Jornal do Brasil”.

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